15.3.12

OPINIÃO: É tempo de acabar com os rios de esgoto!


Hoje, 14 de Março, assinalou-se o Dia Internacional pelos Rios.
Não sei se relacionado com esta efeméride, algo de insólito, mas não tão inesperado quanto possa parecer, aconteceu esta manhã, enquanto decorria a reunião extraordinária do executivo camarário, no auditório da Biblioteca Municipal.
Dois indivíduos, munidos de máscara de protecção, surgiram na sala e depuseram em cima da mesa de reunião um recipiente de plástico que, acto contínuo, destaparam, sendo o espaço invadido por um cheiro pestilento e nauseabundo, de acordo com o relato de diversas pessoas que assistiam à reunião.
Com a mesma serenidade e subtileza com que entraram, os referidos indivíduos saíram do edifício, deixando autarcas e público presente, estupefactos.
No recipiente que deixaram na sala e que rapidamente, pela acção da vereadora do PS foi transportado para o exterior do edifício, podia ler-se a seguinte inscrição: “Água da Ribeira do Vale da Boga, contaminada pela ETAR de Nisa”.
Tratou-se, pois, de uma acção de protesto, que entendo plenamente justificada, chamando a atenção e denunciando um dos diversos crimes ambientais que desde há anos vêm sendo cometidos no concelho de Nisa.
Digo isto com plena autoridade. Não é de hoje nem de ontem que o Ribeiro do Vale da Boga sofre os efeitos do mau funcionamento da ETAR de Nisa, diria mesmo, desde a sua inauguração.
Por várias vezes, com fotos e tudo, em notícias e reportagens no “Jornal de Nisa” denunciei este e outros atropelos ambientais cometidos por entidades públicas, neste caso a Câmara de Nisa, ainda antes das redes de água e saneamento terem sido integradas na empresa Águas do Norte Alentejano.
Nunca fui desmentido, nem mesmo quando a autarquia “encomendou” uma reportagem no “Jornal do Alentejano” com destaque na capa, visando contrariar o que escrevi, documentei e comprovei sobre o (não) funcionamento da ETAR de Tolosa, um crime ambiental junto a outro de natureza económica e política (a ETAR foi reinaugurada sabendo-se de antemão que não respondia, tecnicamente, ao que lhe era exigido).
A ETAR face às anomalias de origem, nunca chegou a trabalhar capazmente. Durante vários anos – não sei se a situação se mantém - despejou directamente num ribeiro que ligava à Ribeira do Sor toda a natureza de esgotos domésticos e industriais, sem qualquer tratamento.
O resultado desta negligência e irresponsabilidade tem sido “paga” pelos habitantes da localidade, mormente os da Rua de Abrantes, suportando continuamente maus cheiros e a invasão de autênticas “nuvens” de mosquitos.
Em Nisa, a situação não é melhor. Os esgotos da zona da Fonte da Pipa têm sido despejados, directamente, sem qualquer tratamento, na Ribeira do Figueiró. Tudo, porque a bomba elevatória que deveria “elevar” os esgotos e encaminhá-los para a ETAR raramente está operacional.
Não funciona e junto à estação elevatória forma-se uma pequena lagoa e um regato de esgotos que vai contaminando os sítios por onde passa (Horta do Boavida) até desaguar no Figueiró.
Quem duvidar do que aqui escrevo, só tem que dirigir-se ao Porto de Arez e à esquerda junto à ponte, percorrer alguns metros ribeira acima.
Estas situações além de vergonhosas e de constituírem verdadeiros atentados à saúde pública, nunca foram devidamente investigadas por quem tinha a obrigação legal e moral de o fazer.
Resta-me manifestar - não conhecendo os autores deste acto, legítimo, de protesto e de cidadania – a minha solidariedade e disponibilidade para o apoio de que necessitem.
Porque ao tomarem nas suas mãos a defesa de um bem que é de todos nós – o ambiente e a qualidade de vida - demonstraram um sentimento altruísta que não pode nem deve ser desprezado.
Pelo Ribeiro do Vale da Boga, pelo funcionamento integral e capaz das ETARs, pelo respeito que as entidades, principalmente as de carácter público, devem ter pela defesa e preservação ambiental e da qualidade de vida das populações, faço meus os versos que o Adriano cantava: “Venho dizer-vos que não tenho medo / A razão é mais forte que as algemas / Venho dizer-vos que não há degredo / Quando se tem a alma cheia de poemas”.
Mário Mendes