No fim da linha. Aqui, onde tudo termina. O país e a região.
Montalvão, vila secular, com mais de 500 anos de história, situada no estremo
do nordeste alentejano, ali entre o Sever e o Tejo, bordada por mil encantos, e
abençoada com uma das mais belas paisagens deste interior esquecido, vivem (ou
sobrevivem) cinco centenas de almas, na sua maioria idosos.
Nestes últimos anos, esta vila, tal como outras por esse
interior fora, foram perdendo lentamente, a importância estratégico-militar que
tivera outrora, com destaque para a posição geográfica dos seus castelos, de
onde se avistava um vasto território inimigo, e que as tornavam em importantes
praças vigilantes ao serviço da segurança do reino. Mas, como o inimigo passou
a ser visto com outros “olhos”, o estado deixou de ver estas localidades como
pontos essenciais da sua política territorial, abandonando-os à sua mercê.
Primeiro foi a emigração, que levou uma grande parte da
mão-de-obra ativa para outras paragens, depois veio o encerramento da casa do
povo, da escola primária e logo a seguir o fechou dos dois postos da guarda
(GNR e Guarda Fiscal). Tudo aqui terminou. Restam os edifícios que serviram
para albergar essas instituições e a memória dos que delas fizeram uso.
A população diminui, assustadoramente, levando consigo muitas
atividades associativas, como o Rancho folclórico e a Banda de Música. Tudo
aqui termina. Ficaram apenas as memórias daqueles que as poderem viver, sentir
e amar!
Quando pensávamos que já não nos tirariam mais nada, pois então,
como por arte mágica, deixamos de ter médico. Sem aviso prévio, para que a
população não pudesse dizer nada, a um ato consumado.
Sim! O médico que vinha cá uma vez por semana, quando vinha, é
certo, mas vinha, agora é nada. Quem quiser ir ao médico, que vá ao centro de
saúde de Nisa (16 km )
e alguns euros a mais, porque a extensão de Montalvão está esvaziada de
funções. NÃO TEMOS MÉDICO!
A melhor solução até ao momento, para os casos de renovar as
receitas dos medicamentos, faz-nos recuar muitos anos atrás, em que um
administrativo vem recolher os pedidos dos utentes, para na semana seguinte vir
a receita, assinada pelo médico. A burocracia cumpre o seu papel.
O concelho de Nisa que tinha ao seu serviço em 1999, uma equipa
composta de 8 médicos e 15 enfermeiros em 10 extensões, a funcionar em pleno,
agora tem 3 médicos e 12 enfermeiros, em 5 extensões a funcionar com
limitações. Pergunto eu, o que aconteceu, entretanto? Para onde foram os
médicos?
Pois se formos analisar os números, com maior detalhe, entre
1999 e 2011, constatamos que existem menos habitantes, e os que resistem, são
mais velhos, portanto, necessitam de mais cuidados de saúde, como se pode
conferir pelos números das consultas realizadas em 1999 e 2011:
Especialidades clinicas
|
Ano de 1999
Número de consultas
|
Ano de 2011
Número de consultas
|
Medicina Familiar
|
29.855
|
29.070
|
Planeamento Familiar
|
664
|
317
|
Pediatria
|
1030
|
2026
|
Saúde Materna
|
129
|
167
|
Fonte : Pordata /INE 2014
Como se pode explicar que, sensivelmente, o mesmo número de
consultas, possa ser executado por três médicos atuais, em vez dos oito de
1999. Algo vai mal, nestes números! Atualmente, cada médico tem, em média, a
seu cargo 2483 pacientes, enquanto em 1999, tinham 1073 pacientes.
Precisamos de mais médicos, como é evidente! Um concelho tão
grande, como Nisa, não pode e não deve ter ao seu serviço apenas 3 médicos,
sejamos realistas.
Porque é que as autoridades locais não agem? A Junta de Freguesia, concorda? E a Câmara Municipal e Assembleia Municipal?
Se for necessário lancem um abaixo-assinado, em prol da saúde
desta gente, porque Montalvão precisa de “Mais saúde e melhor saúde”, não nos
podemos resignar. Aqui, não pode acabar tudo, porque ainda existem pessoas e
memórias. E fazem parte integrante de um país chamado Portugal!
E, sem pessoas e sem instituições, para que serve um território?
JOSÉ LEANDRO LOPES SEMEDO