COMUNICADO DA FNAM - Federação Nacional dos Médicos
"O Governo e o seu Ministério da Saúde publicaram uma portaria
(nº 82/2014) a 10/4/2014 que constitui o mais violento ataque ao SNS e ao
direito constitucional à saúde, visando proceder ao integral desmantelamento de
toda a rede hospitalar pública.
Nesse sentido, a FNAM considera urgente denunciar as seguintes
questões fundamentais:
1- É inadmissível que um assunto desta enorme importância como é
o estabelecimento de critérios para categorizar os serviços e estabelecimentos
dos serviços de saúde seja remetido para uma mera portaria.
Esta medida só pode ser encarada como uma ação deliberada para
fugir á discussão e até à negociação do seu conteúdo, dado que as portarias não
estão obrigadas ao cumprimento dessas exigências legais gerais.
O secretismo da elaboração desta medida culminou com a sua
publicação em portaria para criar a política do facto consumado.
Não é conhecido qualquer tipo de fundamentação para as medidas
aí contidas, nem qualquer estudo dos impactos para as populações em termos
assistenciais.
2- Os objetivos fundamentais desta portaria são o encerramento
arbitrário de serviços hospitalares, alguns deles de elevadíssima qualidade
assistencial e dotados de sofisticada tecnologia, colocar os vários sectores de
profissionais de saúde em mobilidade forçada, despedimento de milhares de
profissionais de saúde, diminuição acentuada da capacidade formação de novos
profissionais, encerramento da maioria das maternidades do país, diminuição acentuada
da capacidade de resposta global do SNS, criar condições incontornáveis para
uma rápida expansão das entidades privadas, à custa dos subsistemas de saúde, e
dar mais um passo, desta vez decisivo, para uma acelerada desertificação de
vastas zonas do interior do país.
3- A portaria confere liberdade às entidades privadas das PPP de
escolherem a carteira de especialidades que mais lhe convêm mediante os
processos de negociação dos contratos de gestão e atribui à ACSS (Administração
Central do Sistema de Saúde) do Ministério da Saúde o poder exclusivo e
arbitrário de autorizar, sem estarem previamente definidos quaisquer
parâmetros, a instalação de novos serviços hospitalares.
4- As especialidades médicas de endocrinologia e de
estomatologia são eliminadas dos hospitais públicos, os hospitais pediátricos
são eliminados, o mesmo acontecendo ao Instituto Oftalmológico Dr Gama Pinto
(Lisboa) , que possui uma elevada diferenciação técnico-científica nessa área
médica, e a dois importantes serviços de cirurgia cardiotorácica como o do
Hospital de Gaia e do Hospital de Santa Cruz (Lisboa). Neste último caso, é
curioso verificar que se trata de um hospital especializado na área do coração
e que ao mesmo tempo que se estabelece a decisão de o liquidar são mantidos
vultuosos contratos nesta área com o hospital privado da Cruz Vermelha
Portuguesa, em Lisboa.
É indispensável lembrar a polémica já existente em torno das
cirurgias cardiotorácicas na cidade de Lisboa, há cerca de 6 meses, com a
divulgação de um relatório de uma comissão nomeada pelo Ministério da Saúde e
que visava tão somente a justificação dos contratos com aquela entidade
privada.
É agora mais do que evidente que o Ministério da Saúde está a
preparar, de facto, o encerramento do Hospital de Santa Cruz, tal como já na
altura alertámos em comunicado.
É, ainda, indispensável sublinhar que os Hospitais de Anadia,
Cantanhede e Ovar desaparecem da relação dos hospitais públicos, o que
significa que o Ministério da Saúde já tomou a decisão de os privatizar ou
entregar às misericórdias das respetivas zonas.
5- De acordo com o conteúdo da portaria, grande parte das
maternidades do nosso país vão ser encerradas.
Nos hospitais do chamado Grupo I deixa de existir a
especialidade de obstetrícia, o que implica o encerramento das respetivas
maternidades.
Assim, irão desaparecer até 31/12/2015 as maternidades nos
seguintes estabelecimentos hospitalares:
- Unidade Local de Saúde Norte Alentejo (Portalegre); Unidade
Local de Saúde Baixo Alentejo (Beja); Unidade Local de Saúde Litoral Alentejano
(Santiago do Cacém); Centro Hospitalar Cova da Beira (Covilhã e Fundão); Centro
Hospitalar de Leiria; Centro Hospitalar do Baixo Vouga (Aveiro, Águeda e
Estarreja); Hospital da Figueira da Foz; Unidade Local de Saúde da Guarda;
Unidade Local de Saúde de Castelo Branco; Centro Hospitalar Barreiro/Montijo;
Centro Hospitalar de Setúbal; Centro Hospitalar do Oeste (Torres Vedras/Caldas
da Rainha); Centro Hospitalar do Médio Tejo (Abrantes, Torres Novas e Tomar);
Hospital de Santarém; Hospital Fernando da Fonseca (Amadora/Sintra); Centro
Hospitalar do Alto Ave (Guimarães e Fafe); Centro Hospitalar do Médio Ave
(Famalicão e Santo Tirso); Centro Hospitalar entre Douro e Vouga (Feira,
Oliveira de Azeméis e S. João da Madeira); Centro Hospitalar Póvoa do Varzim/Vila
do Conde; Centro Hospitalar Tâmega e Sousa ( Penafiel e Amarante); Hospital
Santa Maria Maior (Barcelos); Unidade Local de Saúde de Matosinhos; Unidade
Local de Saúde do Alto Minho (Viana do Castelo); Unidade Local de Saúde do
Nordeste (Bragança, Mirandela e Macedo de Cavaleiros).
6- As várias declarações já emitidas pelo Ministério da Saúde e
seus serviços centrais negando o encerramento de qualquer maternidade ou
qualquer redução de serviços é uma atitude lamentável e revela uma chocante
falta de seriedade política.
O conteúdo da portaria é claro e muito objetivo nas suas
disposições gravosas.
Muitos milhares de cidadãos vão ficar impossibilitados de aceder
aos serviços de saúde.
7- A gravidade desta portaria ministerial culmina o trabalho
disfarçado do Ministério da Saúde em aplicar continuadamente cortes muito
superiores aos exigidos pela Troika, colocando agora a nu uma política
premeditada de destruição do SNS.
É tempo de parar definitivamente com esta ação de destruição
social encetada pelo Governo que se comporta perante os cidadãos portugueses
como se de uma força bélica de ocupação do nosso país se tratasse.
A FNAM apela a todos os médicos, em particular, e aos cidadãos,
para se oporem a estas novas e brutais medidas.
Reafirma, também, o seu empenho em colaborar com todas as forças
e entidades que defendem o SNS e o Estado Social.
É preciso dizer basta. E já !!!"
Porto, 22/4/2014
A Comissão Executiva da FNAM