Antigamente, aproveitava-se
a época, para de um modo folgazão e brejeiro. Havia as “caqueiradas” que se
atiravam para dentro das casas das raparigas, jogava-se o pote, e havia os “friões”
que aproveitavam a época para fazer umas partidas, havia caras mascarradas e
roupas enfarinhadas.
Eram duas semanas
de alegria, que terminavam com as sopas de entrudo no domingo gordo, bem como o
desfile dos friões.
Havia partidas
que se repetiam cada ano: trinquetas atadas, carroças que mudavam de lugar, prendas
duvidosas, perdidos e achados que pretendiam levar ao riso os espectadores,
etc.
Como se disse
era época de partidas, dizia-se que “era carnaval, ninguém levava a mal”. Mas
não foi o que aconteceu, já lá vão mais de cinquenta anos, com um grupo de
jovens de então. Joãozinho, Severino e Joaquim Paulino, entre outros, relataram
assim os acontecimentos:
No dia 1 de janeiro
Um caso se aconteceu
O triste do lavrador
O seu arado perdeu.
Ele ia no seu caminho
Seguindo a sua carreira
Quando avistou seu arado
Nas pontas de uma azinheira.
Ele pensou desta maneira
E pensou na sua ideia
Duas correias prendeu
Para o deitar à terra.
Isto são coisas modernas
No curralinho se passou
E o que me faz pensar
É como o arado voou.
Vinha do pé da sua amada
Ia já pra se deitar
E nisto veio à porta
Ao ouvir o cão a ladrar.
Mas quando foi espiar
Já nada lá encontrou
O que me faz admirar
É como o arado voou.
E eu desta terra sou
Assim ninguém me conhece
Pra onde quer que tenha ido
O meu nome não aparece
Pus-me a escrever a cantiga
Para estes versos espalhar
Para contar a proeza
De um arado a voar
E quem o folheto comprar
Não nada que agradecer
E quem não souber ler
Só tem é que desculpar
Está bem de ver o que aconteceu. O lavrador não levou
a partida para brincadeiras, e vai de ir até Nisa dar parte ao comandante do
posto, na altura o tenente Abóbora.
Era dia de mercado, muito frequentado nessa época, e
de presença quase obrigatória dos Montesinhos.
Feitas as diligências, foi o grupo encarcerado nas masmorras
da GNR, até que deslindassem toda a desventura do lavrador, e logo ali foi lida
a sentença que todo o grupo teve de cumprir:
- uma multa simbólica aos prevaricadores, e a interdição
durante cinquenta anos de cantarem a cantiga que descrevia a epopeia.
Passados que são mais de sessenta anos sobre o episódio,
e a consequente interdição, “O Montesinho” traz ao conhecimento público este
episódio.
·
Joaquim Marques –
“O Montesinho” – Março 2011