Os elitistas acham sempre que fazem parte da elite. A
pirâmide, no entanto, tem uma imensidão de vértices, é provável até que não se
trate realmente de uma pirâmide. Por isso, não faltam perspetivas para que uns
e outros se considerem no topo.
Há o elitismo social, de classe, relacionado ou não com o
elitismo económico; há o elitismo cultural, relacionado ou não com o elitismo
académico; há o elitismo moral, relacionado ou não com o elitismo religioso; há
uma quantidade inúmera de elitismos, derivações de derivações, ramificações,
tipos específicos e especializados, insignificantes para quem está fora, vitais
para quem está dentro.
Em qualquer dos casos, o elitismo é sempre a defesa da
superioridade de uns em relação aos outros, é sempre a afirmação da diferença e
da separação. As suas razões são o núcleo daquilo que coloca gente contra
gente, que justifica guerras. O elitismo garante que uns são mais capazes do
que outros, ou que uns têm mais direito do que outros.
Mesmo quando se dedica a áreas extravagantes, a mundos
microscópicos, o elitismo é sempre uma atitude política. A elasticidade do seu
metabolismo permite-lhe sobrevivência em todas as áreas do espetro político,
sem exceções. Consegue adaptar-se a qualquer habitat argumentativo. Com mais
regularidade do que seria de supor, há apologias do elitismo que, camufladas ou
explícitas, são feitas no próprio instante em que se afirmam contra ele. São a
elite dos que se afirmam contra a elite.
Os defensores das castas dizem que é assim desde sempre,
dizem que essa é a ordem natural, moldam a história e a ciência de acordo com
os resultados lógicos que pretendem alcançar. Não é difícil fazê-lo, os
argumentos são uma massa mais moldável do que o barro.
Depois, para lá disso, muito longe e logo ali, há os
seres humanos, que nascem, alimentam expetativas e morrem. Quando seremos
capazes de olhar para os outros como olhamos para nós próprios? Quando seremos
capazes de olhar para nós próprios como olhamos para os outros?
José Luís Peixoto, in Notícias Magazine (Fevereiro 2017)