21.1.13

ENTREVISTA: "No Alentejo sinto-me sempre em casa"


Dora Maria, 37 anos, lançou em Abril de 2011 o seu primeiro trabalho: “Mar de Tanto Amar”. No sábado, 26 de Janeiro, pelas 21,30h, é este espectáculo que leva a todos os que acorrerem ao Centro de Artes do Espectáculo de Portalegre, num regresso à região que lhe moldou a alma e os sentimentos. Pretexto para conhecermos um pouco melhor esta professora de Abrantes que canta o fado a dançar, espontaneamente.
Quem é a Dora Maria?
“Dora Maria Valente Caldeira é o meu nome e nasci por mero acaso em Lisboa, já que as minhas origens são alentejanas, de Nisa. Vim, no entanto, aos 7 meses de idade para a cidade de Abrantes. Daí haver uma miscelânea, na minha forma de ser e de estar, um toque das planícies alentejanas com laivos das lezírias ribatejanas.”
De onde vem esta motivação e o gosto pelo canto?
“Desde tenra idade, comecei a ouvir fado, primeiro na voz de minha mãe que me embalava a cantar o «Xaile de minha mãe» e foi mesmo com ela que cantei os primeiros versos.
A primeira vez que pisei um palco tinha 5 anos de idade e cantei mesmo sem músicos. O gosto pelo palco surgiu nesse dia…
Desde que me conheço como gente que gosto de cantar. As minhas brincadeiras de infância passavam sempre pela música. Gostava de cantar para os outros. As pessoas juntavam-se para me ouvir e isso fazia-me feliz. Cantava em festivais, no coro da igreja, depois mais tarde na Tuna Académica de Beja, como solista, até que um dia o Fado veio para ficar. Reavivei o gosto pelo fado que tinha ficado adormecido durante alguns anos, quando estive a estudar em Beja. Em tertúlias de amigos, Francisco Fanhais acompanhava-me num fadinho ao final da noite e dizia me sempre que o Fado é que era a minha canção. Senti que ele tinha razão. Comecei a cantar numa casa de fados. A partir daí o Fado não mais me deixou e nem eu a ele.”
Houve alguma razão especial que a levasse a escolher este género musical?
“Como disse, já gostava de fado quando era pequenina. Ouvia fado em casa dos meus pais e em casa de um tio que ouvia essencialmente Fernando Farinha e aquela sonoridade mexia com os meus sentimentos, já naquela altura, de uma forma que não conseguia explicar. Depois, já com 18 anos, comecei a cantar fado. Tem sido uma descoberta e quanto mais trilho os caminhos do fado, mais me apego a ele. É único o som da guitarra, o ambiente místico, os poemas que o fado nos traz.”
 “Mar de tanto amar” foi o primeiro trabalho discográfico (CD). Como surgiu o título e a escolha dos temas e dos autores?
Um dia ao escutar um fado de Amália que dizia assim “Olha a ribeirinha que sonhou ser um rio, sonho de grandeza de ribeira presa que vai com certeza deixar de sonhar” senti que era essa ribeirinha mas com muita vontade de ser rio e nunca deixar de sonhar.
Quis o destino que tivesse encontrado vários afluentes que com as suas águas cristalinas e de forte corrente tivessem aumentado o meu caudal. Em Abril de 2011 este rio veio desaguar neste projeto a que chamei “Mar de tanto Amar». É um projeto de fado tradicional e de inéditos, feitos para mim pelo poeta abrantino José Alberto Marques e o compositor José Horta. O poema «Mar de tanto Amar» foi escrito por mim, num dia de atrevimento poético.”
Qual tem sido a reacção do público e da crítica a este primeiro trabalho?
“Devo dizer que a receção por parte do público superou as minhas expetativas. O espetáculo “Mar de tanto Amar” tem enchido várias salas de espetáculos do país (Abrantes, Nisa, Castelo Branco, Coimbra, Figueira da Foz, Lisboa, Chamusca, Tomar, Sardoal, …) e fora dele em países tais como Suíça, França, Inglaterra, Espanha.
As pessoas têm mostrado bastante agrado e carinho por este espetáculo que tem na sua essência o fado, mas que  tem apresentado algumas surpresas, pois além dos instrumentos musicais normais no fado (guitarra portuguesa e viola), outros instrumentos como acordeão, flauta transversal, percussão e contrabaixo têm dado mais cor  sonora aos fados que interpreto.”
Na divulgação do CD tenho contado com um forte apoio por parte das rádios e imprensa que tem colaborado não só na divulgação dos espetáculos, como também na divulgação da minha música.”
“O fado é a nossa impressão digital”
O que representa o fado para si?
“O fado é o sentir, o pensar e o estar na vida do povo português. Fado é tudo nesta vida. E é exclusivamente nosso. Por muito que outros povos o tentem reproduzir, não o conseguem. É a nossa identidade, a nossa impressão digital.
Parece que estamos a assistir a um movimento de renovação deste género musical. Tem sentido isso nos seus espectáculos?
Tenho notado que cada vez há mais jovens no fado, seja a cantar, seja como instrumentistas e com grande qualidade. O fado já não é visto como música para os mais velhos. Há muita gente nova nos palcos e nas plateias do fado. Claro, que ter sido considerado Património Imaterial da Humanidade contribui imenso para esta renovação.”
Como caracterizaria o seu grupo de acompanhantes, as razões que influenciaram a sua escolha e como justifica a inclusão de um instrumento (o acordeão) não muito habitual neste tipo de música?
“Tive a felicidade de ter encontrado no meu percurso, excelentes músicos, na viola o músico e fadista João Chora, na guitarra portuguesa, Bruno Mira, no acordeão, Bernardo Fouto e contrabaixo, Rui Santos. Em alguns espetáculos tive a participação especial de Ricardo Alves na flauta transversal, Rafael Quinas na percussão e José Horta na guitarra clássica.
Para quando o lançamento de um novo trabalho?
“ Penso que no final deste ano saia o meu próximo trabalho discográfico, estou a trabalhar para isso. Já reuni uma série de fados inéditos que me foram oferecidos e outros feitos por mim e garanto que a qualidade destes estão a dar me alento para que o próximo Cd saia ainda este ano.”
O que podem os espectadores esperar do espectáculo no CAEP e qual a sua expectativa por actuar na região de origem dos seus pais?
Apresentar o meu espetáculo em Portalegre é  de uma grande felicidade para mim, pois é uma cidade que me está ligada através das origens dos meus pais. Desde pequena que conheço a cidade e algumas das suas simpáticas gentes. No Alentejo sinto-me sempre em casa. Brevemente irei também apresentar o «Mar de tanto Amar» noutra das capitais alentejanas, Beja. É como um retorno a casa. O espetáculo em Portalegre acredito  que será  um momento marcante na minha carreira.
Gostaria de deixar aqui o convite a todos os leitores do jornal que venham até este “Mar de fado”. Será com certeza um grande espetáculo e que como já me têm dito que agrada a todas as idades e gostos, pois na sua componente de fado tradicional também se «salpicam» alguns fados inéditos, com sonoridades novas. Mas só visto e ouvido, contado pode ninguém acreditar. Venham até ao C.A.E.P, dia 26 de janeiro pelas 21h30.
Os bilhetes podem ser adquiridos ou reservados de segunda a sexta das 10h/13h e 15h/19h nas bilheteiras do C.A.E.P.  ou por telefone 245 307 498.
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Desejo um bom ano 2013 a todos os leitores do Jornal Alto Alentejo com muitos beijos e fados ….
Mário Mendes in "Alto Alentejo" - 16/1/2013