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14.10.24

TEXTOS DE AUTORES NISENSES (20) - Carlos Cebola - A ópa do Nézinho

Contos de Montes Ermos (2) - A Opa do Nézinho 
 "Mas isto é, exactíssimamente, a história da opa do Nézinho" - exclamou o Adalberto, deixando cair a mão, numa palmada sonora, sobre jornal aberto em cima do joelho. "Que histónia?" - perguntou o Zé Mania. Estavam os dois sentados, à sombra de uma velha latada, em dossel, por sobre a porta da rua. Ler o jornal, ao cair da tarde, era uma cerimónia ritual que ambos faziam, desde há anos. Ou melhor, que o Adalberto fazia, porque era ele quem, sempre, lia. Embora também soubesse ler, o Zé Mania limitava-se a ouvir. E estava certo. Com aquela deficiência, que nunca conseguira superar, ninguém suportava uma leitura feita por ele. Imagine-se. Não pronunciava o "r". Melhor dizendo, trocava o "r" pelo "n". Até no próprio nome. Daí o Zé Mania. E atendendo a tal facto, o Adalberto preferia arcar sozinho com a tarefa da leitura diária. Como a pergunta não merecesse resposta, o Zé Mania insistiu: "Que histónia foi essa da opa do Nézinho?" Em Montes Ermos, como, por certo, em tantas outras vilas, cidades ou simples freguesias, havia, desde tempos remotos, duas colectividades que ocupavam lugares cimeiros nas cerimónias e festividades religiosas. A Irmandade das Almas: a mais antig, numerosa, conceituada e solene, com os seus balandraus preto e ocupando a primeira fila dos bancos da igreja. E a Confraria do Santíssimo, tamb+em antiga, mas não tanto, e que há mais de cema anos começara por abrilhantar a procissão do Corpo de Deus, com as suas vistosas opas vermelhas. E, como sempre acontece, até na comunidade eclesial, entre as duas colectividades havia um fosso, aparentemente sem expressão mas, na realidade, intransponível. Abissal, mesmo. Porque embora todos afirmassem o contrário, ele tinha uma componente cultural, social e, até, política que nem os esforços do padre Albino, durante dezenas de anos, conseguiram ultrapassar. O Nézinho, ainda que religioso convicto, frequentador assíduos das cerimónias da igreja e colaborador, sempre disponível, para todas as tarefas ligadas a manifestações de fé, nunca conseguira ser admitido na Irmandade das Almas. E este era o seu maior desgosto. Um desgosto tão grande que lhe punha a alma mais triste do que a opa preta, que ele não podia vestir, ainda que, dia e noite, sonhasse com ela. Dada a sua condição de trolha nas obras de mestre Tachoulas, um herege confesso, o Nézinho teria de contentar-se, vida inteira, com a opa vermelha da Confraria do Santíssimo. Durante o ano, tudo bem. Mas, em chegando a Semana Santa, o Nézinho entrava numa tristeza digna de quarta-feira de Trevas e nem a alvoradado Domingo da Ressurreição lhe aliviava a alma. Aqueles dias eram mais do que pesadelos. Assistir e acompanhar as solenes procissões de Quinta e Sexta-feir Santas, que até metiam Banda de Música, a Vila inteira em fatode cerimóni e ele, Nézinho, ter de misturar-se com a multidão, sem ao menos poder envergar a opa vermelha, porque naqueles dias, de luto, todo o cerimonial era presidido e realizado pela Irmandade das Almas, de opas pretas. Certa noite, em Quinta.feira Santa, horas antes de a procissão sair, encheu-se de coragem. Já na igreja, apanhou o sacristão a jeito. " Eu não posso vestir uma opa preta?" - perguntou. O sacristão olhou-o, quase horrorizado. "Nem pensar!". "Mas... então...". "Nem pensar!" - repetia o sacristão, enquanto mudava um castiçal do altar de Santa Teresinha para o altar do Senhor Morto. No ano seguinte, o Nézinho tentou de novo. Desta vez junto do senhor vigário. "Se eu visto uma opa encarnada em todas as procissões, por que é que não posso vestir uma opa preta, nas procissões da Semana Santa?" - perguntou. Mas nem as palavras do padre Albino lhe aliviaram o luto da alma. Um ano depois, voltou a tentar com nova táctica. Ele tinha conhecidos, amigos, até, parentes na Irmandade das Almas, seria de caso que nenhum deles poderia dar uma ajuda? E, como o não conseguiu, voltou à carga, no ano seguinte. E no outro. E durante os demais anos que lhe restaram de vida. Sempre em vão. Chegando a Semana Santa, com aquelas procissões tão lindas, que percorriam as ruas da Vila, arrastando um mar de gente e o Nézinho, porque não podia vestir uma opa preta, lá se misturava com a multidão, participando, é certo, mas com a alma mais triste que o manto da Senhora de Ao Pé da Cruz. Tristeza que, por ironia do destino, teve seu fim num primeiro dia de uma Semana Santa. Depois do velório, quando o vigário se preparava para "encomendar a alma" do Nézinho e o Tito Marceneiro se aprestava para fechar o caixão, o presidente da Confraria do Santíssimo ergueu-se pesaroso e, com um rosto de pedra batida, colocou aos pés do cadáver a opa vermelha da sua Confraria. E foi então que aconteceu o que não era suposto acontecer. O padre Albino acercou-se do caixão. Pegou na opa vermelha, que devolveu ao estupefacto presidente da Confraria do Santíssimo e, com o ar mais esfíngico deste mundo, colocou em seu lugar a opa preta da Irmandade das Almas. As lágrimas quedaram-se, por momentos, nos olhos de uma assistência lacrimosa. Num envergonhado à parte e em voz sumida, o sacristão ainda sussurrou: "Não faça isso, senhor vigário". " E por que não?" - retorquiu o padre, no mesmo tom, para logo acrescentar: " Que ao menos na morte, tenha aquilo que mais desejou em vida e nunca conseguiu". " Mas... senhor vigário...". "Assunto encerrado". E, levantando a cabeça e erguendo a voz, o padre Albino entoou: "Pai nosso, que estais no céu..." Quando o Adalberto se calou, o Zé Mania olhava-o boquiaberto. " A que propósito vem toda essa histónia da opa do Nézinho? Tá aí no jonnal?"."Não. Não está". " Então, não pencebo". "Nem queiras! Aliás, a notícia, que vem, aqui, no jornal, também não é para perceber". "Então, é pana quê?" Atirando com o jornal para cima da cadeira, o Adalberto levantou-se, retesou as pernas e começou a dirigir-se, vagarosamente, para o outro lado do Largo, alheio ao bracejar e às imprecações do atónito Zé Mania. 
* Carlos Tomás Cebola - Novembro, 99 in Folha de Montemor

15.4.20

TEXTOS DE AUTORES NISENSES (10) - Carlos Tomás Cebola - Rapsódia

RAPSÓDIA 
Naquela tarde, Mestre Horácio era um homem feliz. Tudo correra, afinal, melhor do que, tantas vezes, tinha imaginado. Tudo certinho. A tempo, sem sobressaltos, sem hesitações, sem falhas.
A alvorada, logo pela manhã, às oito. A procissão, com andores, anjinhos e fogaças, depois da missa do meio dia. O concerto, à meia tarde, pela força do calor. E se estava calor!
Mas, tudo, como Deus com os Santos.
Antes de sentar-se, puxou a cadeira um pouco mais para o lado: para a sombra, e gritou para dentro da tenda do Chumbinho, atrás de si.
"Rapaz, uma cerveja, por favor. Bem fresca".
Tirou o chapéu, que ajeitou, numa cadeira vaga. Passou o lenço pelas têmporas, perladas de suor. Limpou as mãos húmidas. Guardou o lenço no bolso das calças e esperou. Pouco tempo. O rapaz veio e colocou a bandeja, sobre a mesa, à sua frente.
"Uma cerveja".
Mestre Horácio agradeceu com um gesto e sorriu. Antes de levar a garrafa aos lábios,
respirou fundo. Duas vezes. De alívio, como quem, finalmente, atirava para longe um fardo
que, havia um mês, lhe pesava sobre os ombros. Um mês... Sim, pelo menos desde que ficara decidido incluir no programa a sua pequena rapsódia "Papoilas e Malmequeres". O facto nada teria de preocupante, se não fosse o Américo. O da tuba. Uma jóia de homem, aquele Américo, mas Música não era com ele, por mais que fizesse das fraquezas, força. O Américo, que até era um habilidoso, podia ter nascido para tudo: para músico, nunca. Verdade que não havia memória de ele ter faltado a uma lição, durante o solfejo; nem de ter falhado um ensaio, depois de lhe ter sido entregue o instrumento dos seus sonhos: a tuba.
"É só soprar e, para isso, tens tu arcaboiço!", gracejara a Vila, em coro. E ele, bonacheirão, rira do gracejo. Mas aprendeu. E foi para a estante. Segundo tuba, porque não havia terceiro.
De qualquer forma, ele merecera o prémio, mas o que começou a acontecer, também, foi que, a partir de então, era preciso estar, sempre, com um olho em todos e o outro no Américo, porque, de repente e sem cerimónias, zás, saía uma nota que não estava na pauta.
Pois, desde que, democraticamente, a Banda (direcção, sócios e músicos, incluídos), determinara que "Papoilas e Malmequeres" faria parte do programa do concerto, no Domingo de festa, Mestre Horácio não dormia sem pesadelos.
A ideia salvadora veio, numa noite de insónia e esteve em incubação até, quase, à hora do concerto.
"Com um bocadinho de sorte e de habilidade...", pensava ele. Mas, principalmente, teria de apanhar a tuba do Américo, sem que ele desse por tal e mesmo em cima da hora.
Felizmente, aconteceu. E, com uma rolha de cortiça, previamente, feita à medida, e um lenço de assoar, Mestre Horácio atulhou o tubo da tuba, de modo a que, por ele não saísse o mais leve som.
Ao subir para o coreto, foi só recomendar ao Américo que tocasse pianinho, quanto mais,
melhor, e dizer ao Abílio, o primeiro tuba, que tocasse por dois. Depois, havia de ser à vontade de Deus e, por isso, entregou-se nas mãos de Santa Cecília, que era a Santa da sua devoção.
Com o nervosismo, que, sempre, se apoderava do Américo, quando se sentava à estante, ele nem daria pela marosca. E não deu.
O concerto foi um êxito. A Banda esteve impecável do primeiro ao último acorde. Todos. Até o Américo. E, outra vez, Mestre Horácio sorriu. Levou a cerveja aos lábios e foi, nesse preciso momento, que apareceu a Dulce. Miúda endiabrada, aquela. Fina, que nem um coral. Esperta, até dizer basta. Aprendeu o solfejo, antes do á-é-i-ó-u. Passado um ano, à estante, já fazia oitos com o flautim, no dizer dos músicos mais velhos.
- "Boa tarde, Mestre Horácio!".
- "Olá, Dulce. Tu queres alguma coisa? Um refresco, um pirolito..."
- "Obrigada, Mestre. Eu só vim até aqui, porque tenho de dizer-lhe uma coisa".
- "E, também não queres sentar-te?"
- "Posso?"
- "Claro, claro. Senta-te e conta lá".
Depois de olhar, de uma ponta à outra, o Largo, que só então começava a despovoar-se, a
Dulce sentou-se numa cadeira mais próxima.
- "Com licença".
- "Então, que coisa tens tu para dizer-me?"
- "Promete que não conta a ninguém?"
- "Prometo".
- "Jura?".
- "A pés juntos".
A Dulce pareceu ficar satisfeita com o que ouviu. Voltou a olhar, atentamente, o Largo. Cruzou os braços sobre a mesa e debruçou-se até apoiar, neles, o queixo bem desenhado.
- "Senhor Mestre, esta tarde, alguém quis pregar uma partida ao meu pai".
- "Ora essa!".
- "Verdade".
- " E estás segura do que dizes?".
- "Tão certa, como eu chamar-me Dulce".
- "Vê lá bem que, nem sempre, as coisas são aquilo que parecem!".
A voz do Mestre, já de si grave, desceu mais uma oitava. A Dulce olhou-o sem mover um
único músculo da face. Continuou a fitá-lo, como se os seus olhos dissecassem, uma a uma, as rugas que se espalhavam pelo rosto do velho Mestre. Calada e misteriosa, como uma esfinge. Depois...
- "Foi como lhe disse. Alguém quis pregar uma partida ao meu pai".
- " E tu suspeitas de quem poderá ter sido?".
- " Não sei".
- "Mas, não sabes o quê? Não sabes se suspeitas ou não sabes se não suspeitas?".
- "Não, Mestre". Não sei se suspeito, se tenho a certeza".
-" E queres acusar alguém?".
- "Aí é que está o problema. Por vezes, estou mesmo a ver que...".
-"Cuidado. O padre António Vieira (sabes quem foi, pois sabes?), dizia que com os olhos do amor, o corvo é branco; com os olhos do ódio a pomba é negra. Tu estás a falar-me de qualquer coisa que fizeram ao teu pai. Pois, até pode acontecer que não estejas a ver, com os olhos certos. Trata-se do teu pai e a voz do sangue...".
-"Pode ser, mas eu...".
-"Olha. Eu não sei e tu, ainda, não disseste o que aconteceu, o que sabes ou do que suspeitas, que terá acontecido. Não sei, mas tenho a certeza de uma coisa. Ninguém, nesta Terra, é capaz de fazer, seja o que for, que possa magoar o Américo. O teu pai. Ninguém. Vai por mim!".
- "Isso eu sei. Mas também sei que o meu pai não tem jeito de acertar com a entrada do último andamento das "Papoilas e Malmequeres" e, se hoje, no concerto, acontecesse o que é costume, seria um grande desgosto para ele. Não é verdade, Mestre Horácio?"
- "É... E ele não merecia, pois não?".
- "Não, Mestre".
- "Mas, ouve cá, rapariga. Toda esta história tem alguma coisa a ver com o concerto?".
- "Não, Mestre, não tem nada, mesmo nada, eu é que... Desculpe, estão à minha espera para irmos dar uma volta, pela feira. Até..."
Após um momento de hesitação, muito breve, a Dulce, com um sorriso brejeiro, despediu-se e correu para um grupo que, à distância, a esperava, já, com alguma impaciência.
Mestre Horácio bebeu o último gole da cerveja. Pegou no chapéu e, ao desviar a cadeira, a
seu lado, viu, outra vez, a Dulce, junto de si.
- "Então, Dulce?".
- "Desculpe, Mestre, mas, com a pressa, esqueci-me de dar-lhe o lenço, que estava dentro da tuba do meu pai. É seu, não é?".
-"Então e..."
- "A rolha? Deitei-a fora e o meu pai nem deu por ela! Não deu por nada!".
Lesta, como uma lebre, em dois saltos, voltou para o grupo que a esperava, ainda.
Mestre Horácio tornou a colocar o chapéu, na cadeira vaga, a seu lado.
- "Rapaz, outra cerveja. Por favor:... Bem fresca!".
-"É para já, Mestre", respondeu o Chumbinho, do fundo da tenda.
Acomodou-se melhor, como pode e a cadeira o permitiu. Guardou o lenço no mesmo bolso, onde tinha o outro e, com ambas as mãos, cofiou as guias do bigode farto.
"Esperta, até dizer basta. A Dulce: uma das papoilas da sua Rapsódia", pensou, ainda.
Trauteou, em surdina, o início do último andamento da sua composição e voltou a sorrir.
Quando veio, de dentro, e se preparava para colocar a cerveja, em cima da mesa, o
Chumbinho, ainda, começou:
-"Outra cerveja p´ró Mest...".
Não acabou a frase. Voltou atrás e meteu a garrafa na geleira. Mestre Horácio dormia.
Beatificamente.
- Carlos Tomás Cebola - Junho,96

20.2.20

NISA: Assembleia Municipal aprovou voto de pesar pelo falecimento do prof. Carlos Cebola

A Assembleia Municipal de Nisa aprovou por unanimidade, na sessão realizada em 14 de Fevereiro, um Voto de Pesar apresentado pela CDU sobre a morte do professor Carlos Cebola, cujo texto abaixo transcrevemos. 
VOTO DE PESAR
Falecido no dia 4 de Fevereiro de 2020, Carlos Dinis Tomás Cebola nasceu em Nisa, no dia 9 de Novembro de 1928.
Estudou em Alcains (Castelo Branco) e em Nisa (Colégio Dr. Durões Correia), tendo concluído o Curso Geral dos Liceus, no antigo liceu Mouzinho da Silveira, em Portalegre.
Fez o Curso do Magistério Primário em Évora e exerceu em Reguengos de Monsaraz, em Montemor-o-Novo e em Luanda (Angola), até 1971. A partir dessa data ocupou, sucessivamente, os cargos de subinspetor escolar, subdiretor do Distrito Escolar de Luanda e inspetor escolar.
Depois de 44 anos de serviço, aposentou-se em 1994, como inspetor principal da Inspeção-geral de Educação.
Viveu em Montemor-o-Novo, onde casou, em 1958, e nasceram os seus dois filhos.
Foi nesta cidade que escreveu as suas peças de teatro, em1956, a “Três Tardes de Três Outonos”; em 1958, “A Cigarra e a Formiga” e em 1961, “A Acácia do Quintal” (apresentada pela RTP e, mais tarde, editada em separata pela revista HUMANITAS do Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra). 
Em1962 ganhou um segundo prémio no 1º concurso de originais para a RTP, com a peça “O Retrato de Marcelo” e, nesse mesmo ano, a Censura proibiu “Quinto Mandamento” que, no ano seguinte, 1963, foi inexplicavelmente autorizada e acabou por permitir, ao Grupo Cénico da Sociedade Recreativa e Dramática Eborense, numa encenação de José Saloio, ganhar todos os primeiros prémios, no teatro da Trindade, em Lisboa.
Em 1964, escreveu “João Cidade” que, depois dos necessários ajustamentos, voltou ao palco do Cine - Teatro Curvo Semedo, de Montemor-o-Novo, em 1995, integrada nas Comemorações do 5º Centenário do nascimento de S. João de Deus.
Em 1999, escreveu “Tamar”; em 2008 “Invasões”, no 2º centenário das invasões francesas e em 2012, “Frei Adão”, a única peça ainda não representada.
Em 2005, as Edições Colibri e a Câmara Municipal de Nisa editaram “Nisa, a Outra História” e em 2006, a mesma Editora e a Câmara de Montemor-o-Novo editaram “Em Montemor, o maior...”
Em Luanda escreveu três peças de “Teatro Infantil” para a Companhia Teatral de Angola.
Em 2014 com o apoio da União de Freguesias de Espírito Santo, Nossa Senhora da Graça e São Simão e edição da Colibri foi publicado “Nisa, História e Tradição”.
O Professor Carlos Dinis Tomás Cebola, demonstrou ao longo da sua vida ser uma pessoa empenhada, dedicada e conhecedora das suas raízes, investigou e publicou variados trabalhos sobre a Vila de Nisa.
Ao Prof. Carlos Cebola o nosso sincero agradecimento pelo seu trabalho, empenho e dedicação à Vila que o viu nascer.
Até Sempre Professor!

14.2.20

NISA: A morte de Carlos Cebola, o "menino" que queria ser músico


"Em menino sempre sonhei que, um dia, quando fosse grande, havia de ser artista. Músico ou pintor. Mas, quando terminada a escola primária esperei que me destinassem à António Arroio, em Lisboa, puseram-me uma mala na mão e mandaram-me para o seminário, em Alcains. Anos mais tarde, quando manifestei a vontade de seguir uma carreira musical, foram-me logo dizendo que "com as notas da música não se compram os melões". E acabo inspector escolar. Hoje, também é uma arte. Embora uma daquelas que nada, ou muito pouco, tem a ver com aquela que, aqui, nos juntou: a Música."   in "Música e Comunicação" - 1982
Carlos Dinis Tomás Cebola, o Inspector Cebola, faleceu no passado dia 4 de Fevereiro no Hospital de Évora, aos 91 anos de uma vida dedicada à Educação e à Escrita. O seu funeral realizou-se em Montemor-o-Novo, sua cidade adoptiva e constituiu enorme manifestação de pesar.
Carlos Dinis Tomás Cebola nasceu em Nisa a 9 de Novembro de 1928. Após a instrução primária, estudou no seminário de Alcains e em Nisa, no Colégio do Dr. Durões Correia, tendo concluído o Curso Geral dos Liceus, no antigo liceu Mousinho da Silveira em Portalegre. 
Fez o Curso do Magistério Primário em Évora e exerceu como professor em Reguengos de Monsaraz, Montemor-o-Novo, que viria a ser a sua terra de adopção e Luanda (Angola) até 1971. A partir dessa data ocupou, sucessivamente, os cargos de Sub-Inpector Escolar, sub-director do Distrito Escolar de Luanda e Inspector Escolar, tendo-se aposentado em 1994, como inspector principal da Inspecção Geral de Educação, após 44 anos de serviço.
Residia em Montemor-o-Novo, onde havia casado em 1958 e lhe nasceram os seus dois filhos. Foi também nesta vila, que ascendeu a cidade em 1988, que escreveu as suas peças de teatro, a partir de 1956, com "Três Tardes de Três Outonos"; em 1958 "A Cigarra e a Formiga" e em 1961 "A Acácia do Quintal", apresentada pela RTP e mais tarde editada em separata pela revista Humanitas do Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Em 1962 ganhou um 2º prémio no 1º concurso de originais para a RTP com a peça "O Retrato de Marcelo" e, nesse mesmo ano, a censura proibiu "Quinto Mandamento", proibição que, no ano seguinte (1963) foi levantada, sem qualquer explicação e autorizada a sua representação, que acabou por permitir ao Grupo Cénico da Sociedade Recreativa e Dramática Eborense, numa encenação de José Saloio, arrebatar todos os primeiros prémios em disputa no Teatro da Trindade, em Lisboa.
Em 1964 escreveu "João Cidade" peça que, após alguns ajustamentos, voltou a ser representada no Cine Teatro Curvo Semedo, em 1995 e integrada nas comemorações do 5º centenário de S. João de Deus, patrono da cidade montemorense.
Em 1999 escreveu "Tamar", em 2006 "Em Montemor, o Maior..." livro dedicado a S. João de Deus, editado pela Colibri e patrocinado pela autarquia montemorense, "Invasões" em 2008, no segundo centenário das Invasões Francesas, e em 2012 "Frei Adão", peça sobre uma figura religiosa nisense e a única que ainda não foi representada. Em Luanda escreveu três peças de teatro infantil para a Companhia Teatral de Angola.
A Nisa, sua terra natal, dedicou, em 2005 "Nisa, a Outra História", estudo no qual apresenta uma nova versão sobre as origens da vila, sustentada na sua ligação aos Templários e em 2014 "Nisa, História e Tradição", edição apoiada pela União de Freguesias de Nisa. 
Nisa, a música, o artesanato, o associativismo, a história local e as tradições, estiveram sempre na primeira linha do pensamento de Carlos Cebola. À terra-mãe, se deslocava sempre que a saúde o permitia, fosse para a apresentação dos seus livros ou para a participação em colóquios ou eventos para que era convidado, como a apresentação pública dos primeiros alunos da Escola de Música da Sociedade Artística Nisense, da qual saiu uma notável conferência publicada num opúsculo sob o título "Música e Comunicação" e editada pela Câmara Municipal em 1982, e um outro sobre a figura de Mestre Félix, cidadão nisense com uma vida dedicada à música. A Nisa deu Carlos Cebola um contributo assinalável, colaborando, desde os anos 60 em todos os jornais que nesta vila se publicaram, desde Luanda com as suas "Crónicas de Angola" para o "Correio de Nisa" até ao "Jornal de Nisa", com textos de excelente nível, abordando os mais diversos temas da cultura, da história local e não se eximindo até, de dar as suas opiniões sobre temas e problemas locais, mostrando dessa forma que, mesmo longe, o seu coração nizorro não deixava de pulsar pelo desenvolvimento da terra e do concelho.  Em 2006, aquando da apresentação do livro "Em Montemor, o Maior..." na Biblioteca Municipal Almeida Faria, tive o privilégio de testemunhar  a homenagem, o apreço e gratidão dos montemorenses, dos mais novos aos mais idosos, por um filho adoptivo da sua cidade. Não admira, por isso, que a Theatron - associação cultural, tenha agraciado o cidadão, o escritor, o teatrólogo, Carlos Cebola,  com o título "Sócio Honorário". 
A autarquia montemorense, se for justa, far-lhe-á o merecido preito de homenagem. O mesmo se espera do Município de Nisa, terra onde nasceu, viveu e sobre a qual escreveu textos de grande valor histórico e cultural e que, ainda hoje, mantém gritante actualidade.
Nisa e Montemor-o-Novo, com a morte de Carlos Dinis Tomás Cebola, perderam um cidadão interveniente, lúcido, vertical, um escritor de memórias e histórias que hão de perdurar por muito tempo.  Que o seu exemplo frutifique!

Mário Mendes in "Alto Alentejo" - 11/2/2020

5.2.20

A morte do Prof. Carlos Cebola

 “Eu, Carlos Dinis, por aqui passei,
e ao passar quis erguer os meus sonhos ou novo Pedrão.
Já chegado, quase ao fim da minha viagem,
ainda hoje não sei se o consegui ou não.”
Hoje o dia amanheceu triste. Partiu um homem de cultura, com paixão pelo teatro mas sobretudo um homem vertical, bom e humilde que soube deixar a sua marca na vida daqueles que se cruzaram com ele. A Theatron teve esse privilégio. Até sempre, professor.
Foi desta forma que o Theatron - Associação Cultural de Montemor-o-Novo deu a notícia da morte do nosso conterrâneo, professor Carlos Dinis Tomás Cebola, ocorrida ontem, dia 4 de Fevereiro naquela cidade alentejana onde residia desde há muitos anos.
A morte do professor Carlos Cebola, aos 91 anos de uma vida dedicada ao Ensino e à Escrita, é uma grande perda para a Cultura nisense, do Alentejo e do país.
Em próximas publicações traçaremos aqui a biografia deste distinto nisense e daremos a conhecer uma parte substancial da sua obra, um legado cultural que nos deixa e que nos presenteou, enquanto colaborador do "Jornal de Nisa".
Partiu o Professor Carlos Cebola. Que a sua memória perdure, com a mesma intensidade dos escritos que nos deixou.
Mário Mendes

2.1.15

Apresentação do livro "Nisa, História e Tradição", de Carlos Cebola

 Decorreu no passado dia 20 de Dezembro, em Nisa, no Salão Nobre da Santa Casa da Misericórdia, a apresentação pública do livro “Nisa, História e Tradição” da Autoria do Inspector Escolar Carlos Dinis Tomás Cebola.
Numa sala completamente cheia, o Presidente da União de Freguesias de Espírito Santo, Nossa Senhora da Graça e São Simão, Sr. João José Malpique representando a entidade promotora da edição da obra, acompanhado do Sr. António Manuel Valente, Provedor da SCM de Nisa, do Profº João José Santana, Presidente da Assembleia Municipal; pelo orador e actor Victor Guita e do autor Carlos Cebola; deu as boas vindas aos presentes e indicou as razões que levaram a que a cerimónia tenha decorrido neste espaço, (ausência de resposta da Câmara á utilização do Auditório da Biblioteca Municipal); da pertinência da publicação, uma obra de referência na preservação e divulgação do património imaterial da Freguesia, situação defendida pelos membros da mesa. Da unanimidade dos membros do executivo e da Assembleia de Freguesia, na aposta em apoiar as iniciativas culturais valorizando um homem da nossa terra que mesmo estando fisicamente longe, descreve como ninguém a terra (usos e costumes) que o viu nascer.
O actor Vítor Guita deu a conhecer aos presentes a temática do livro: Concluir a tese defendida pelo autor no livro anteriormente editado “Nisa, a outra história”, O casamento da Dinis, na descrição de um ritual único que é o casamento “ á moda de Nisa”, a linhagem dos Gamas e sua ligação a Nisa, o poeta Gomes Correia, o Visconde Vale da Sobreira, etc… concluiu, no agradecimento ao autor pela forma apaixonada como escreve e que lhe permitiu levar á cena em tantas ocasiões.



O Autor professor Cebola de forma comovida, descreveu a sua vida e obra, agradecendo a todos os que contribuíram para que o livro fosse uma realidade, a quem pesquisou na investigação, à autora da aguarela que é a capa do livro, a Nisa, terra que o viu nascer e às que o acolheram e á sua Família.
O Professor Joaquim Carmona defendeu a pertinência na realização do ato neste salão da Santa Casa, referindo os elementos decorativos existentes na sala Telas e fotografias dos beneméritos da Fundação Lopes Tavares e os presentes, numa geminação perfeita entre Nisa e Montemor-o-novo.
Terminada a cerimónia houve sessão de autógrafos e confraternização com familiares e amigos.
Posteriormente e a convite da União de Freguesias foi efectuada visita á zona retratada na “aguarela” capa do livro identificada como “Portas de Montalvão”, onde foi colocada uma pedra memória (estilização do Desenho de Duarte D’Armas datado de 1 509, executado em granito azul de Alpalhão) alusiva á comemoração dos 500 anos de foral manuelino atribuído à Notável Vila de Nisa em 15 de Novembro de 1 512.
O livro está à venda os locais de atendimento da Freguesia.
João Malpique
Nota biográfica do autor
Carlos Dinis Tomás Cebola nasceu em Nisa, em 9 de Novembro de 1928.
Estudou em Alcains (Castelo Branco) e em Nisa (Colégio Dr. Durões Correia), tendo concluído o Curso Geral dos Liceus, no antigo liceu Mousinho da Silveira, em Portalegre.
Fez o Curso do Magistério Primário em Évora e exerceu o Magistério em Reguengos de Monsaraz, Montemor-o-Novo e em Luanda (Angola) até 1971.
A partir dessa data, ocupou sucessivamente os cargos de subinspector escolar, subdirector do Distrito Escolar de Luanda e inspector escolar. Depois de 44 anos de serviço, aposentou-se em 1994, como inspector principal da Inspecção - Geral de Educação.
Desde então, reside em Montemor-o-Novo, onde havia casado, em 1958, e nasceram os seus dois filhos.
Foi, também, em Montemor-o-Novo que escreveu as suas peças de teatro, a partir de 1956 com "Três tardes de três Outonos", em 1958 com " Cigarra e a Formiga", em 1961 com a "Acácia do quintal", (apresentada pela RTP e, mais tarde, editada em separata pela revista HUMANITAS do Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra), em 1962 ganhou um segundo prémio no 1° concurso de originais para a RTP com "O Retrato de Marcelo" e nesse mesmo ano a Censura proibiu "Quinto Mandamento" que, no ano seguinte, 1963 foi inexplicavelmente autorizada e acabou por permitir todos os primeiros prémios ao grupo Cénico da Sociedade Recreativa e Dramática Eborense, numa encenação de José Saloio, no Teatro da Trindade, em Lisboa, em 1964 com "João Cidade", que depois dos necessários ajustamentos voltou ao palco do Cine-teatro Curvo Semedo, em 1995, integrada nas Comemorações do 5° Centenário da nascimento de S. João de Deus. Em 1999 escreveu "Tamar", em 2008 "Invasões", no 2° centenário das invasões francesas, em 2012 "Frei Adão", a única ainda não representada. Em 2005, as Edições Colibri e a Câmara de Nisa editaram "Nisa, a outra história". Em 2006, as Edições Colibri e a Câmara de Montemor-o-Novo editaram "Em Montemor, o maior..."
Em Luanda escreveu "Teatro Infantil", (três peças), para a Companhia Teatral de Angola.
* Fotos de José Manuel Lopes