26.12.21

NISA: O nosso velho Eucalipto

Neste artigo, dedicado aquela velha árvore do Rossio, vai um pouco da minha alma e estou certo que a sua comunicabilidade também vos há-de tocar, pelo que representa para todos nós.
Não é decerto um monumento inigualável ou original a examinar, mas no fundo ele é maravilhoso pelo que envolve e emprestando-nos a sua presença, contemplamos, retrospectivamente, todo o nosso passado de meninos. Parece-me útil que esta singela recordação nos traga um sentimento de convicção dos laços indestrutíveis de amizades que ali crámos e ainda hoje perduram.
Foi à sua sombra amiga que se juntaram os Graças, os Ribeirinhos, os Piedades, os Caritas, os Caldeiras, os Reisinhos, os Louros, os Dinis... e todos pela primeira vez contemplámos a velha escola em obtusa interrogação.
O Senhor Professor dava o sinal de entrada, e com a sacola numa das mãos e o boné na outra, lá nos íamos sentando, muito encostados.
Levantar! - ordenava o mestre, mirando as novas caras, como que procurando adivinhar o que dali lhe sairia.
- Primeiro que tudo, quero dizer-vos: É aqui que se aprende a ler - e mostrando o livro que segurava numa das mãos, exclamava: Este é o vosso primeiro livro!
A E I O U.
Foi o nosso primeiro hino de amor e naquela sala nos irmanamos em humilde comunhão de sentimentos. Daí a pouco, já todos nos conhecíamos de há muito e connosco estava o nosso velho Eucalipto que nos mirava através dos vidros das janelas.
Mais afoitos, iniciámos os ensaios da fisga, do monta-cavalo, do pincho e aquela velha árvore era sempre a nossa companhia ideal.
Voluntariamente ali construimos o nosso palácio de ilusões e dali nos transportámos à viva lição da vida, de riso e pranto...
Não temos bibliotecas ou obras que nos indiquem o que desejaríamos anotar quanto aos seus anos, mas apenas, que os que são vivos se lembram de o conhecer assim. Por ali passaram gerações da nossa Nisa e não podemos contestar que todos ali descansámos um pouco, como no cumprimento de uma obrigação.
Estivemos ali - mas todos! Desde os mais ilustres aos mais simples, todos fomos dele, velhos ou novos, de uma maneira ou de outra.
E ao contemplar aquela velha árvore tão nossa, duma ternura tão menina, apenas digo:
Se fosse celebrado o Dia da Escola, ela seria o monumento real e vivo que eu escolheria para depor uma coroa de flores em memória dos que por ali passaram em nobre ansiedade de sacrifícios, para formar esta linda Côrte das Areias!
Ilídio Nogueira Leitão - Correio de Nisa - 20 /2/1965