29.12.12

OPINIÃO: Lares sem comparticipação


DINHEIROS  PÚBLICOS, USO PRIVADO
1. Nestes dias, em que o natal ultrapassa o sentido estritamente religioso, para procurar transmitir algum conforto humano e espiritual, visitei familiar que ingressou, de forma certamente definitiva, em lar de idosos. No caso, um estabelecimento gerido por uma santa casa da misericórdia, que tem (como todas as congéneres) estatuto de instituição privada, mas de SOLIDARIDADE  SOCIAL...
2. O lar em causa, ainda novinho em folha, muito acolhedor, ao que me pareceu, prima pela excelência do serviço prestado. Muito humanizado, com o NÚMERO DE UTENTES ADEQUADO a um espaço deste tipo (25 utentes na valência de «internamento»), para não cair na condição (de tantos, com mais de uma centena de utilizadores) de «armazém» de velhos, frio e desumanizado.
3. Foi CONSTRUÍDO COM DINHEIROS PÚBLICOS, conjugando o financiamento de dois fundos comunitários e recursos financeiros municipais, que quase asseguraram o custo total da obra. Obviamente (não é nenhum «lar» clandestino da periferia da grande Lisboa) teve, no momento certo, o PARECER FAVORÁVEL DA SEGURANÇA SOCIAL portuguesa.
4. Acabada a obra, no momento da entrada em funcionamento, o estado português não assegurou o financiamento habitual neste tipo de situações para, assim, quem tem reformas baixas, recursos exíguos, poder ingressar, nomeadamente, em primeira mão a população local mais pobre e necessitada. Tanto mais que, muitas vezes, para viabilizar estas iniciativas, OS HABITANTES  DA TERRA DÃO GENEROSO  CONTRIBUTO através das mais variadas iniciativas (festas, donativos, etc.)...
5. Na circunstância, obviamente SÓ HÁ UTENTES QUE (eles mais os filhos) PODEM  PAGAR o que rivaliza com o que custa a estadia em lar privado (largas centenas de euros, mensalmente).Com a agravante (natural, decorrente deste contexto de formulação de preços) de a maioria dos que conseguem entrada serem forasteiros, o que, sem ser mal na proporção adequada, se desmedidamente, ofende a população local, nomeadamente a mais pobre.
6. O estado, por opção, pode entender, momentaneamente, não financiar a construção de novos equipamentos para apoio à terceira (e cada vez mais quarta) idade. A nosso ver, opção errada, mas politicamente «legítima». O que não pode ser é, a uma organização que, estatutariamente, deve, prioritariamente, SERVIR OS MAIS HUMILDES, depois desse mesmo estado aprovar candidaturas a fundos públicos, pagar a obra na quase totalidade, não estabelecer os acordos de cooperação que comparticipem adequadamente o ingresso, em primeira mão, de quem mais precisa e merece apoio social.
7. Se entenderem, não financiem obras novas por algum tempo... Mas, àquelas que foram edificadas com dinheiros públicos, forneçam URGENTEMENTE O APOIO FINANCEIRO que garanta que se serve quem mais precisa e não apenas os que podem pagar. Deixem esse papel para os lares de iniciativa privada que, legitimamente, têm o seu espaço no apoio aos idosos. Aí, sim, que os que, livremente escolhendo assim, sabem o que têm a pagar...
8. Insistimos.O que não está bem é um lar construído com dinheiros públicos e gerido por organização do setor social, por falta de apoio do estado no seu funcionamento, não seja capaz de dar prioridade a quem mais necessita, independentemente dos seus rendimentos.
Ao menos, no contexto e condições da época , OS  ASILOS  DE OUTRORA serviam para albergar os pobres e «mendigos»...
* José Manuel Basso - Médico Gerontologista