27.10.19

OPINIÃO: Histórias da Carochinha

Os cerca de 350 mil votos perdidos pelo PSD e CDS deram ao PS, a recuperação do egocentrismo político, que já mostrou no passado e que tem sido recordado por Carlos César. Os votos atribuídos ao PS, em teoria, permitem que se veja livre dos “empecilhos” que obrigavam Costa a respeitar “a palavra dada”.
Os portugueses mostraram no voto, que queriam a reedição da gerigonça, mas a negação do PCP que perdeu mais de 113 mil votos, acusando a imprensa e a contestação interna de serem os culpados do desastre, deu ainda ao PS a legitimidade de não querer acordos. Então o que fez António Costa alterar o que defendeu em campanha e na noite eleitoral? É simples, ao negociar por escrito, o BE iria obrigar o PS a ser coerente com as medidas ambientais, sociais, públicas e com a alteração da legislação laboral da troika. Mas a pressão do poder económico falou mais alto.
É o PS que já não precisa da esquerda nem da direita para ser governo. Ao não querer afirmar um acordo que garanta uma estabilidade responsável, sabe que, durante a legislatura, sempre poderá acenar à esquerda e à direita para obter acordos pontuais. Claro que neste campo, à partida, excluem-se dois partidos, se mantiverem as suas posições extremistas:
1 – O CHEGA retirou muitos votos a um PSD estilhaçado por dentro e a um CDS eclipsado. Rui Rio apresentou-se como o Costa v.2 e Cristas “orgulhosamente só”, a ser popularucha. Nuno Melo desvalorizou o extremismo do VOX, carrasco da direita espanhola e Cristas acenou a tudo quanto mexe. Esta falta de ideologia, a renegar as origens, os valores que defendiam e a ficarem reféns dos lobbies empresariais, colocaram de novo, o CDS no “táxi”.
Mas o CHEGA vai ter de mostrar aos seus eleitores, um pouco mais do que populismo extremista; porque não vai ganhar terreno, só com os ataques a minorias étnicas. Também, não parece que tenha sucesso a atacar o SNS e a Escola Pública… Todos sabemos que esses privados sobrevivem na base da exploração e que, o desinvestimento na saúde e na educação são a sua única rampa de lançamento.
2 – O Iniciativa Liberal que afinal é conservador apresenta uma vontade antagónica de combater a corrupção. Quando afirma que “o liberalismo é um grande inimigo da corrupção”, é não perceber em que águas navega. Também não percebe que ao colocar o sistema público no mesmo patamar de escolhas do sistema privado, é como apostar na roleta russa para o ensino e para a educação. Mas dizem ao que vão e não escondem o que CDS e PSD quiseram promover de forma encapotada à privatização da CGD.
Esta é a nova face do parlamento que PSD e CDS em crise ajudaram a transformar. A razão é muito simples, a ideologia foi diabolizada e até parece ser uma coisa do passado ter uma ideologia. Mas não é! Quem defende uma ideologia, defende uma linha de pensamento e um modelo de sociedade fundamentada nas raízes do debate político a sério e não, da política espetáculo como se vê crescer. Para exemplificar, a ideologia social-democrata que Sá Carneiro afirmou ser de esquerda, foi pervertida, convertida e por isso engolida mais facilmente, vítima da sua relação com o sistema capitalista.
Mais de metade da população que reclama melhores serviços públicos, menos impostos e uma justiça eficiente, não se digna a participar nas escolhas dos seus representantes. Contudo, o sistema eleitoral, também tem as suas curiosidades gritantes. Portalegre com metade dos eleitores a votarem (51.600 votantes), elegeu dois deputados com menos de metade dos votos (23.013), contra os 28.587 votos que não elegeram ninguém…
Agora, com o governo mais “gordo” em democracia, vamos esperar mais quatro anos, para ver Centeno a cativar e o povo a pagar; e ver Costa a perguntar, “quem quer casar com a Carochinha” e os restantes partidos, a olharem para o lado, para verem qual é o “João Ratão” de serviço…
A esta hora em que me estão a ouvir, estou em Roma num encontro da FIODS, onde vai ser discutido entre outros assuntos, a Diretiva Europeia, relacionada com a dádiva de sangue e de plasma. Aqui não existe a história da Carochinha, mas sim a história da vida das pessoas. E por isso, é importante que os governantes olhem a sério com responsabilidade para esta realidade.
Antes de partir, fui oferecer um livro de histórias infantis ao meu neto, no qual constam as tradicionais histórias, como a da “Carochinha”. Fi-lo a pensar no seu futuro, pois sei que vou ter de o alertar para algumas várias histórias da “Carochinha” …
Paulo Cardoso -25-10-2019 - Programa "Desabafos" / Rádio Portalegre