Milhares de aves mortas durante a apanha noturna da azeitona
Entre 70.000 e 100.000 aves protegidas são anualmente mortas em território nacional, fruto desta prática ilegal que o Estado Português tarda em proibir
Na sequência da divulgação de um Relatório da Junta da Andaluzia, relativo ao impacte da apanha nocturna de azeitona por meios mecânicos na avifauna local, a Quercus solicitou em Dezembro de 2018 a intervenção do Governo e das autoridades nesta situação, no sentido de lhe serem fornecidas informações mais detalhadas sobre a realidade nacional e, sobretudo, no desencadear de acções de fiscalização urgentes. Os dados concretos a que a Quercus teve agora acesso, relativos a duas dessas acções de fiscalização efectuadas pelo SEPNA/GNR dão conta da magnitude do problema, que deve atingir, e segundo uma estimativa conservadora da Quercus, entre 70.000 e 100.000 aves em território nacional. A Quercus exige assim, que neste início de campanha da apanha da azeitona, o Ministério do Ambiente e o Ministério da Agricultura tomem medidas urgentes no sentido de suspender a prática da apanha nocturna de azeitona, realizada por meios mecânicos nos olivais superintensivos, devido aos impactes nefastos que esta tem na vida selvagem, e em especial na avifauna.
Um Relatório da Junta da Andaluzia - Consejería de Medio Ambiente y Ordenación del Territorio, divulgado no final de 2018 e relativo ao impacte da apanha nocturna de azeitona realizada por meios mecânicos nos olivais superintensivos da região, dá conta dos grandes impactes que este processo tem na avifauna local, concluindo que, mesmo numa perspectiva conservadora, mais de dois milhões e meio de aves morreram, em 2017/18, no decurso da apanha nocturna de azeitona. Estes números referem-se à Comunidade Autónoma de Andaluzia, em províncias como Sevilha, Córdoba e Jaén, e comprovam mais um dos grandes problemas ambientais causados pelas práticas do olival intensivo e superintensivo, que nas últimas décadas se tem instalado descontroladamente na Península Ibérica.
Na sequência da divulgação deste Relatório da Junta da Andaluzia e uma vez que, face à grande proximidade geográfica e à ocorrência de várias espécies de aves semelhantes nos olivais portugueses, seria também previsível a existência de grandes impactes da apanha nocturna de azeitona em território nacional, a Quercus solicitou de imediato a intervenção do Ministério do Ambiente e do Ministério da Agricultura, assim como do Serviço de Protecção de Natureza e Ambiente da GNR (SEPNA/GNR), nesta situação. O objectivo das comunicações enviadas às várias entidades com competências na área iam no sentido de serem fornecidas à Quercus informações mais detalhadas sobre a realidade nacional no que diz respeito a este problema e,
sobretudo, solicitar a realização de acções de fiscalização urgentes, tendo como objectivo actualizar a informação disponível e avaliar os verdadeiros impactes desta prática.
Em Fevereiro de 2019, o SEPNA/GNR informou a Quercus que, no seguimento da sua denúncia, efetuou diversas diligências e fiscalizações durante os meses de Dezembro e Janeiro, e que “em sequência da apanha noturna da azeitona de forma mecanizada, foram constatadas algumas situações das quais resultaram na morte de aves, tendo sido elaborados diversos Autos de Noticia por Danos Contra a Natureza, remetidos aos serviços do Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre – Ministério Público de Fronteira, para instrução dos respetivos processos.” O SEPNA/GNR informou também que “deu conhecimento à autoridade administrativa competente, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), propondo a elaboração de eventuais alterações legais no sentido de prever o impedimento da apanha noturna da azeitona, garantindo a proteção das espécies que pernoitam nos locais alvo destas ações.”
Segundo os dados a que a Quercus teve agora acesso, em apenas duas destas acções de fiscalização realizadas à noite no Alentejo foram detectadas no total 375 aves mortas, fruto da apanha nocturna de azeitona, 140 aves numa das acções de fiscalização (27/12/18) e 235 aves em outra (2/1/19). Algumas das espécies de aves atingidas por esta mortalidade foram o Tordo-comum, a Milheirinha, o Lugre, o Pintassilgo-comum, o Verdilhão, o Tentilhão-comum e a Toutinegra. Tendo em conta que a grande mortalidade de aves registada apenas se refere a duas acções de fiscalização realizadas no mesmo lagar, mas num período de menor recepção de azeitona, e que existem mais lagares no país a receber azeitona proveniente de colheita nocturna, a Quercus prevê, numa estimativa bastante conservadora, que por noite são mortas entre 700 e 1000 aves fruto desta prática irresponsável, o que por época de colheita de azeitona representa a morte dum número minímo de 70.000 aves, mas que poderá atingir uma máximo de 100.000 aves.
Apesar de todos os alertas, Governo tarda em agir
A Quercus sabe que, na sequência dos autos de notícia levantados pelo SEPNA/GNR e a consequente investigação realizada, corre no Ministério Público um inquérito sobre a mortalidade de aves derivada da apanha nocturna de azeitona em olivais superintensivos, relativo a eventuais “Danos contra a Natureza”, dada a magnitude do problema evidenciado. A Quercus deposita inteira confiança neste trabalho que está a ser realizado pela Justiça e aguarda serenamente o apuramento da verdade dos factos e a eventual responsabilização dos culpados.
Relativamente áquilo que foi a atitude do anterior Governo em relação a esta matéria, a Quercus critica de forma marcada a falta de acção demonstrada nos últimos meses pelo Executivo sobre este assunto, não entendendo o porquê desta atitude. Em Fevereiro de 2018, a Quercus solicitou ao Governo que, de forma atempada e perante os dados dramáticos registados, tomasse medidas legislativas urgentes, no sentido de proibir a apanha nocturna de azeitona que ocorre sobretudo nos olivais superintensivos da região do Alentejo. Contudo, apenas em Julho passado, a Quercus recebeu uma resposta do Governo sobre o assunto, onde nenhuma solução cabal para o problema foi apresentada.
Agora, neste novo início de campanha de apanha da azeitona, e perante os dados divulgados, a Quercus vem exigir que o novo Governo, através do Ministério do Ambiente e do Ministério da Agricultura, tomem medidas urgentes no sentido de suspender a prática da apanha nocturna de azeitona, realizada por meios mecânicos nos olivais superintensivos, devido aos impactes nefastos que esta tem na vida selvagem, e em especial na avifauna. Recorda que recentemente, a Junta da Andaluzia - Consejería de Agricultura, Ganadería, Pesca y Desarrollo Sostenible emitiu uma resolução preventiva para a suspensão desta prática e que a mortalidade de aves registada em território português viola claramente a legislação nacional e
Directivas comunitárias, podendo ter sérias consequências não só para a biodiversidade e o Ambiente, mas também para a imagem do país e dos seus sectores económicos.
A Quercus apela também às empresas produtoras de azeite que rejeitem a azeitona proveniente da apanha nocturna, e que à semelhança do que algumas empresas já fizeram, optem voluntariamente pela suspensão desta prática nos seus olivais superintensivos. A Quercus continuará a acompanhar esta grave situação e usará de todos os meios legais ao seu dispor para que a legalidade seja reposta e os valores naturais sejam respeitados.
Lisboa, 24 de Outubro de 2019 A Direcção Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza
A Direcção do Núcleo Regional de Portalegre da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza