Milagre!
O espectáculo que o Rancho Típico das Cantarinhas de Nisa
nos ofereceu na noite da quinta-feira passada, apesar de todas as reservas que
sempre pomos quanto a actuações de amadores, e demais crianças, não constituiu
para nós verdadeira surpresa.
Contávamos com a vitória de um trabalho honesto e concebido
para progresso e elevação mental desta notável Vila.
É caso para dizer, parafraseando o grande António Vieira,
que o Sr. Rodrigues Correia, com a sua dignidade e a sua arte, foi buscar à
montanha a rocha adusta; desbastou, corrigiu, aperfeiçoou, aqui usa o escopro,
além o cinzel; aqui marcou um sorriso, além uma gentileza; e, por todo o roble
espalhou prodigamente vida e beldade. Logrou almas e corpos e modelarmente fez
surgir uma alma colectiva que é a alma do seu Rancho, o Rancho das Cantarinhas
de Nisa.
O espectáculo decorreu célere e bem nos pareceu que foi
momento rápido, de fugida, tal o encanto, ternura e a beleza dos bons
sentimentos que se evolou em todo o ambiente da sala, perante a numerosa
assistência que o aplaudiu.
Por outro lado, as peças apresentadas foram prova segura
duma técnica que bastante completa se revelou; e foi pena, muito lamentável,
que uma parte do público não tivesse sabido interpretar vários passos da
primeira peça, rindo, quando devia calar, farfalhando, quando devia abortar a
traição dos soluços.
Rodrigues Correia tem mostrado até aqui – e esperamos que o
continue a demonstrar no futuro – que é merecedor dos nossos aplausos, do nosso
carinho, do nosso amparo. E, sendo assim, ele e sua digna família, cujo
trabalho de execução foi de mérito, tornar-se-ão credores dos nossos
agradecimentos, e do reconhecimento de todos os nisenses.
E nós cá estamos para defender a sua obra, a obra dum
artista e dum incansável lutador.
“Correio de Nisa” – 23/1/1965