Se há desportos em que o apelo às emoções, ao imprevisto, à
sensação de prazer e de aventura, sejam permanentes, o moto-cross é, sem
dúvida, um deles.
Estes terão sido os “condimentos” que fizeram despertar,
desde muito novo – e ele é, ainda, bastante jovem – Vincent Ferreira, nascido
em França e residente em Nisa, para a prática da modalidade. Uma modalidade não
muito praticada na nossa região, mas um autêntico “desporto de culto”, no
litoral do país.
Vincent Ferreira veio ao mundo em 1990 e chegou a Nisa com
seis anos, nessa idade, já com o gosto pelos desportos de duas rodas, por
influência do pai. Estudou durante três anos no Colégio Santo António,
principalmente para se adaptar à língua e cultura portuguesa e aos nove anos
obtém a primeira licença desportiva de competição passada pela Federação
Portuguesa de Motociclismo. Depois disso, não mais parou e é ele que nos conta
o seu percurso de desportista.
“Comecei a andar de bicicleta desde pequenino, com o meu pai
e mais tarde, com 9 anos, senti-me atraído pela moto. Comecei com uma de 65 CC,
na categoria de Infantis e de pois na de Iniciados (85 CC), categorias nas
quais participei em provas do campeonato nacional.
No princípio era só para me divertir e o divertimento, numa
prova do Campeonato Nacional de Iniciados, em Águeda, transformou-se em dor. Tive um acidente,
parti a clavícula e quatro semanas depois, desloquei a direita.”
Foram tempos difíceis, preocupações transmitidas à família,
o moto-cross também é feito de horas amargas, de quase abandono.
Mas não foi isso que aconteceu ao Vincent Ferreira. A queda
e os ferimentos, despertaram-no para a necessidade de saber mais, treinar e
aprender, para melhor dominar o “cavalo a motor” em terrenos íngremes e cheios
de dificuldade, como são os das provas de todo o terreno.
“Foi, de facto, uma lição. O ano passado, já com uma moto de
250 CC participei nalgumas provas de Enduro para aprender e este ano a
competição já será levada mais a sério e irei procurar uma melhor
classificação.”
A preparação para as provas de competição não pode ser feita
ao acaso e o Vincent explica os cuidados que tem para poder competir ao melhor
nível.
“A princípio treinava com o meu pai, com amigos e sozinho,
prática que se mantém, mas agora tenho a ajuda do Bruno Alvarinhas que foi duas
vezes campeão nacional de Enduro e do Valter Martins, um ex-praticante da
modalidade.
Os treinos, faço-os em pistas fechadas, para ganhar
agressividade. A agressividade, no moto cross e para quem não sabe, consiste em
sair das curvas com maior rapidez, acelerar mais nas rectas e travar o mais
tarde possível.”
Esse seria, na estrada, um comportamento de risco,
perguntámos.
“ O moto-cross dá-nos adrenalina, uma sensação de aventura,
de prazer, mas claro, tem também alguns riscos. Depende sempre da preparação e
conhecimento do terreno que se tem, da forma como se encara cada prova e também
de serem tomadas algumas precauções.
Não há muito tempo, assustei-me a valer na Figueira da Foz.
Estava em prova, fiz uma curva à direita e logo a seguir havia uma lomba muito
grande e não desacelerei a tempo. A roda da frente passou, mas a traseira,
não...
Foi uma boa lição e quando vejo uma lomba tenho que
desacelerar e ter uma leitura mais rápida e com maior antecedência do terreno.
Este é um dos “segredos” para se evitar riscos desnecessários no motocross.”
Os factores de risco, pelo que ouço, estão sempre presentes
nas provas de motocross, mas é isso que lhe dá outra noção de espectáculo e
cativa cada vez mais os jovens e menos jovens, que não se importam de engolir
“toneladas” de poeira, para poderem ver, ao vivo, as motos de potentes
cilindradas e os seus condutores.
“Este ano, na Lousã, com provas em dois dias, no 2º dia,
estava muito cansado e desmaiei em cima da moto. Ia a subir uma trialeira e a
meio da subida desmaiei e não soube o que me aconteceu.
O perigo, faz parte da competição e apesar destes percalços
gosto do enduro, de andar de moto, passar obstáculos, conviver com amigos e
passar os fins-de-semana com o meu pai, que tem sido o meu principal
“treinador”. Foi com ele que comecei e é com o apoio e as “dicas” que me tem
dado que tenho prosseguido.”
Os desportos motorizados não são para todas as bolsas. São
desportos caros, com despesas em equipamentos, combustível, deslocações,
alojamento e outras...
“ É um desporto, realmente, muito caro, mas faço-o por
gosto. Por dinheiro, não andaria no Enduro. Estou a correr por uma equipa de
Torres Novas, a Team RHC Motos que dão apoio ajuda, tanto na assistência e
preparação de motos, na aquisição de material, com preços mais atractivos. Os
patrocinadores dão também e alguma ajuda para não suportar as despesas sozinho.
Outro problema é as deslocações, pois a maioria das provas são no norte e
centro do país, o que obriga, quase sempre, a despesas de alojamento.
Este ano estou a contar participar em seis provas de Enduro
e de motocross nos regionais Centro e Norte, conforme a disponibilidade.
Entre Setembro e Dezembro há também provas em Tomar, Ourém e
no norte, a contar para o campeonato nacional de Cross Country.
Às despesas de que falei há acrescentar ainda as taxas de
participação, que não são nada acessíveis. Paga-se para inscrição na Federação
Nacional de Motociclismo (175 euros) e se formos à Baja, que tem uma prova de
motos, num dia, a inscrição é de 375 euros. Em França, por exemplo, a Le Trefle
Lozerien, em Auvergne, uma das mais conhecidas, a inscrição, por dois dias,
custa 170 euros.
É uma disparidade de preços e acho que se as condições
fossem mais atractivas, haveria, por certo, muitos mais jovens a participar”.
Mário Mendes in “Jornal de Nisa” nº 230 – 25/4/2007