26.9.10

OPINIÃO: O Outono da República

O azul do céu, dá lugar ao escuro e sombrio das nuvens carregadas, o calor ao frio da brisa leve que sopra de Norte, as folhas já caducas das árvores abatam-se no chão cobrindo como um manto castanho toda uma extensão em seu redor, e os homens lançam à terra as primeiras sementes, enfim chega o Outono, que para uns é sinónimo de fim de ciclo e para outros como o inicio de tudo…
Tal como hoje à cem anos atrás, a sociedade vivia tempos outonais, com o fim de um ciclo politico e inicio de uma nova fase, que se pretendia de esperança e progresso no futuro. E entretanto as folhas já caíram mais de cem vezes das árvores e os homens já fizeram muitas sementeiras, mas a classe política continua a mesma, sem vontade de construir novos rumos para esta sociedade de fim de ciclo.
A 5 de Outubro, celebra-se a República, que em Portugal teve a sua implantação no ano de 1910, como todos sabemos, por esta altura a vida era muito difícil no nosso país, muita pobreza e fome, mais de 80% da população era analfabeta e trabalhava a maioria do sector primário sem condições mínimas, a roçar em alguns casos a escravatura.
E hoje o que temos, Cem anos depois? Que valores ficaram deste século que findou à uma década, e que teve pelo meio um regime autoritário e ditatorial, que durou tempo demais e nos fez um povo mais dependente, menos participativo e mais auto-excluído da sociedade.
Olhando para o passado, damo-nos conta que a participação era uma forma de intervenção clara na construção dos novos caminhos que se queriam traçar, e o nosso distrito teve algumas figuras (poucas), que se destacaram por essa altura, e uma dessas personagens foi uma mulher, que a meu ver assume o papel de mãe da República no distrito de Portalegre, Adelaide de Jesus Damas Brazão Cabete conhecida como Adelaide Cabete (Alcáçovas, Elvas, 25 de Janeiro de 1867 — Lisboa, 14 de Setembro de 1935) filha de Ezequiel Duarte Brazão e de Balbina dos Remédios Damas, foi uma das principais feministas portuguesas do século XX. Republicana convicta, foi médica obstetra, ginecologista, professora, maçom, publicista, benemérita, pacifista, abolicionista, defensora dos animais e humanista portuguesa. E acrescentamos ainda que das suas mãos saiu o bordado da primeira bandeira da República Portuguesa. A figura é tão fascinante que não se pode imaginar o seu vasto percurso politico e de vida, à luz daqueles tempos em que a mulher não tinha os mesmos direitos que os homens e que uma simples e pobre órfão alentejana agarra todas as oportunidades que a vida lhe dá para e se enriquecer de conhecimentos (estudando) e lutar pelas suas convicções e que ainda hoje são válidas – “Protecção à Mulher Grávida” e “A Luta Anti-Alcoólica nas Escolas”, manifestou-se contra a violência nas touradas, o uso de brinquedos bélicos e outros assuntos que se revelariam temas vanguardistas para a época, temas esses que ainda mantêm a sua actualidade.
É neste contexto que devemos valorizar e enaltecer o percurso de vida de figuras, naturais do nosso distrito, e que se bateram por ideais bem concretos e válidos nesta República de cidadãos.
Espero que o distrito de Portalegre, saiba tirar partido destas comemorações dos cem anos da República e dê a conhecer as suas figuras ilustres que estão para além dos salões nobres.
JOSÉ LEANDRO LOPES SEMEDO