As três freguesias têm em comum a proximidade do rio Tejo, a ruralidade da paisagem e o envelhecimento da população. A de Montalvão foi sede de concelho entre 1512 e 1836. Na Igreja Matriz está sepultado o último Grão-Mestre dos Templários, D. Frei Vasco Fernandes.
Em 1801, no concelho (Montalvão e Salavessa) viviam 1327 almas. De 1864 a 1940 esse número
teve um crescimento significativo, mas a partir desta década dá-se um movimento
de sentido contrário. A perda de população é progressiva e vai aumentando de
censo para censo. O êxodo rural, a emigração interna (Grande Lisboa) e para o
estrangeiro (França, principalmente)
deixam a freguesia quase sem gente activa para trabalhar a terra, a grande
fonte de rendimento das populações.
A construção da Celulose do Tejo e da Barragem de Cedillo, no início da
década de 1970 trouxeram alguma esperança
e animação às povoações e concelhos próximos (Nisa e Vila Velha de
Ródão) e a empresa sedeada em Ródão conseguiu fixar gente jovem e é, ainda hoje, a principal empregadora dos dois
concelhos vizinhos do Tejo.
A tendência de despovoamento do país, especialmente do interior
acentuou-se na década de 80 e a população portuguesa entrou num processo de declínio, passando de uma
população jovem a uma população
envelhecida com uma representação piramidal. Este envelhecimento demográfico,
com a perda da população jovem de forma progressiva, foi mais sentido no
interior do país e o concelho de Nisa não foi excepção.
Desde os anos 80, o número de nascimentos tem vindo a diminuir,
situação reflectida na base da pirâmide
etária que mostra haver cada vez menos crianças.
De tal modo que em 2021, na divulgação dos resultados dos Censos, o
concelho foi notícia por numa das suas freguesias (Santana) ter registado a
maior percentagem de idosos em Portugal. Segundo os números do Censos 2021, em
Santana, 74,7% da população tinha pelo menos 65 anos de idade. Havia na
freguesia uma única criança, situação que motivou uma reportagem de um
semanário nacional.
A freguesia de S. Matias com seis povoações (Cacheiro, Velada, Chão da
Velha, Monte Claro, Falagueira e Montes Matos) está praticamente despovoada.
Sobram as casas, algumas de aspecto senhorial, as ruas desertas onde não se vê
vivalma e os dados são reveladores do declínio das povoações, apesar da
construção da Barragem do Fratel no rio Tejo que teve um efeito perverso, a
nível demográfico: criou esperança e renovação, por um lado; acentuou a
desertificação após a barragem entrar em funcionamento e, sobretudo, com a
automatização desta infra-estrutura.
Dados dos Censos de 2021 indicam que esta freguesia tinha apenas 5 crianças entre os 0-14 anos e
104 pessoas com 65 anos ou mais.
Das seis povoações referidas, quatro tinham escola. Duas foram
requalificadas e aproveitadas para outras funções, as restantes deixadas ao
abandono e aos caprichos da natureza. São monos e nódoas na paisagem.
Voltemos a Montalvão, sede de antigo concelho. Nos dados dos Censos de 2021, a freguesia tinha 8 crianças com idades até aos 14 anos e havia 173 pessoas com 65 anos ou mais.
A antiga vila mantém o edifício da escola, com rés do chão e 1º andar, adaptado a centro cultural e espaço museológico, os edifícios da GNR e Guarda Fiscal, a necessitarem de obras de reabilitação, um lar de idosos moderno e funcional, o antigo castelo e a imponente igreja matriz, pedras angulares do seu passado histórico.
“ O interior não pode perder a esperança”
Margarida Ribeiro é a presidente da Junta de Freguesia Montalvão, mãe
de dois jovens, um com 20 e outro com 15 anos. Após a formação em engenharia
agrária optou por fixar-se na terra onde nasceu e aponta algumas das razões da
falta de jovens na sua freguesia.
“A Freguesia de Montalvão era uma terra de pessoas que trabalhavam
principalmente no campo, na agricultura e na pastorícia, trabalho esse muito
desvalorizado na sociedade. Em busca de vidas melhores ou com mais qualidade,
saíram das suas terras muita gente em idade reprodutiva, tanto a nível
profissional como pessoal.
Esse foi o principal factor que fez com que a nossa freguesia ficasse
envelhecida e com pouco jovens.
Actualmente temos menos de 10 jovens e crianças, pois a falta de mais
empresas na zona causa essa situação, mas também temos uma população pouco
empreendedora, isso leva a que cada vez sejamos menos.”
Questionada sobre as medidas que poderiam ser tomadas para tentar
inverter esta situação, disse-nos:
“ Quanto ao futuro, apenas me resta dizer que temos esperança que mude, pois existem agora mais meios e condições para que as pessoas se possam fixar no interior, estou a referir me ao custo de vida mais barato, acesso a novas tecnologias, entre outros que promovem uma melhor qualidade a nível de vida pessoal.”
O desporto como paixão
João Mourato Ribeiro tem 15 anos e é um dos poucos jovens da freguesia.
Estuda em Nisa, está no 10º ano, área de desporto.
O desporto é, de resto, uma das suas actividades preferidas de ocupação
dos tempos que sobram do estudo, ainda que sejam raros os companheiros para uma
boa “futebolada” na rua. Ao contrário do irmão, o campo e a vida rural
dizem-lhe pouco. Prefere aproveitar o tempo a jogar na internet e as suas
preferências centram-se mais nas ofertas do mundo urbano.
Não é apenas animar a malta, como diz a canção, mas atentarmos nos
números do nosso progressivo vazio demográfico, em Nisa e no país.
O concelho de Nisa, globalmente, é um espelho dos dados das três
freguesias referidas. Basta dizer que em 2024 havia 455,9 pessoas com 65 anos e mais, por cada 100 menores de 15
anos.
De acordo com Lara Patrícia Tavares,
num estudo para a Fundação Francisco Manuel dos Santos, “a baixa fecundidade veio para ficar. Em
Portugal como n maior parte do mundo.”
Não haverá cada vez menos crianças e jovens só porque nascem menos
bebés! É preciso ter em linha de conta o envelhecimento populacional, a saída
de jovens por falta de oportunidades económicas, a escassez de serviços de
apoio às famílias, entre outros factores.
Não há uma “receita” para vermos aumentar o número de bebés!
Sabemos, sim, que são precisas medidas para reconstruir o tecido social
e estas não podem centrar-se em medidas avulsas e de efeito , apenas, imediato
ou de “paninhos quentes”.
É certo que o poder local não pode resolver por si só, um problema que
é nacional e até transnacional, mas pode pensar com responsabilidade no
desenvolvimento do território e dar o seu contributo sério para a minorar o
problema do “inverno” demográfico.
Como um “dinossauro” autárquico dizia, já há alguns anos, “continuamos a construir infra-estruturas que, no futuro próximo, ninguém irá utilizar”.
É preciso criar condições, entre estas, emprego, ambiente, segurança, para atrair e fixar pessoas, jovens casais ,
preferencialmente, que aqui em Nisa, no
Alentejo e no interior do país possam
sentir ser este o seu lar para poderem dar mais vidas à vida e abrir novos
horizontes ao futuro.
Para além do poder local, as políticas públicas são essenciais para responder aos desafios desta realidade de um país envelhecido e que deverá perder 23% da sua população activa, entre os 20 e os 64, até 2060, segundo Lara Tavares, atrás citada.
Em Nisa, a Câmara Municipal implementou o programa Nascer em Nisa com a atribuição de um valor pecuniário de 500 euros (primeiro filho) ou 750 euros (segundo filho). É uma ajuda ou incentivo esporádico e que não representa uma solução. É preciso ir mais longe, desde o estímulo à criação de emprego, à melhoria de salários, à criação de apoios à habitação, como a auto-construção, apoios nas rendas de casa e na reabilitação de casas devolutas.
Estes são, seguramente, dois dos principais problemas que o país
enfrenta , a baixa natalidade e a baixa taxa de fecundidade.
As entidade públicas, Estado e Autarquias Locais, não podem desresponsabilizar-se do papel que lhes cabe
na organização social do território e na criação de condições de vida digna
para os seus naturais e para todos aqueles que sentem o nosso país como a sua
casa e nela querem construir o seu ninho familiar e o seu futuro.
• Mário Mendes in "Alentejo Ilustrado" - Setembro 2025