11.11.24
OPINIÃO: Pobreza: o problema nos bairros
Os bairros à volta de Lisboa parecem estar em polvorosa e, escutando a turba mediática, há algo, como um mantra, que entra no ouvido: “eu bem dizia”. E, de facto, muita gente disse alguma coisa sobre o dia em que as pessoas se iriam revoltar.
O que muitos não imaginaram foi o porquê da revolta; porque parte dessas pessoas sempre alegou problemas de etnia e credo associados à violência, esquecendo-se do essencial: o meio. Quando Ortega y Gasset nos fala da circunstância, alerta-nos para esse tema.
São bairros de pobres, de pessoas que vivem de trabalhos que mais ninguém quer, na construção civil, a lavar escadas de prédios, por turnos que começam à meia-noite e terminam às oito, etc., da caridade do Estado ou da caridade de associações e de alguns patrões. São bairros onde há gangues, daqueles que se veem nos filmes e que se aproveitam da miséria dos vizinhos para poderem viver marginalmente.
Nos bairros da Grande Lisboa, o maior problema é económico, é um problema social, é uma questão de marginalidade que vai além do étnico. O Estado falha nas suas funções nestes locais - não é por pagar RSI ou não haver IRS para quem recebe o salário mínimo que o Estado cumpre a sua função na totalidade - e a personificação do Estado é na Polícia.
Não sou eu que vou julgar a atitude de quem disparou o tiro sobre Odair Moniz, porque é que o fez e em que condições, mas é difícil alterar a perceção quando temos um homem morto a tiro, um homem cujas pessoas que com ele conviviam dizerem que era um homem bom, um homem cujo desaparecimento leva à revolta. Como é que é encarada essa revolta? Com carga policial. O Estado falha em tudo, exceto no homem que os vem prender.
O que resta às pessoas destes bairros sociais e que cujos desenvolvimentos ultrapassam fronteiras concelhias? Qual a sua condição?
São bairros onde as vozes dos que tendencialmente defendem os operários, os trabalhadores precários, como seriam as de Paulo Raimundo ou de Mariana Mortágua, não chegam. Muito menos a de Pedro Nuno Santos.
Mas são bairros cuja inoperância do Estado nas suas funções - na educação, na saúde, na justiça - leva à revolta, e cuja revolta faz com que a voz mais escutada seja a de André Ventura e a de todos os que querem expulsar imigrantes e pessoas de etnia diferente.
O que se passa nos arrabaldes de Lisboa põe a nu a falência do marxismo e é a querosene que alimenta a extrema-direita.
João Rebelo Martins - Gestor de empresas
• Jornal de Notícias - 08 novembro, 2024