15.10.24
OPINIÃO: Casas vazias
A crise na habitação está à vista de todos. Portugal está imerso numa nova bolha imobiliária que pesa sobre a economia e está a empobrecer largas camadas da população. Há já algum tempo que nos encontramos numa emergência habitacional que afeta principalmente os rendimentos mais baixos e as gerações mais jovens, mas também os rendimentos médios. Ao contrário da crise de 2008, que afetou principalmente os bancos, a atual é mais corrosiva socialmente, porque os preços não param de subir e, numa situação destas, é mais difícil definir políticas que combatam o mercado.
Após o rebentamento da bolha imobiliária de há mais de 15 anos, a construção em Portugal caiu a pique, precisamente quando a população está a crescer devido à chegada de imigrantes.
Segundo Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas, é preciso construir 45 mil casas por ano, mais 13 mil do que as construídas em 2023, para responder às graves carências habitacionais do país. Ainda para mais, o défice de casas coincidiu com uma nova situação na economia global em que o setor imobiliário se tornou um refúgio para os investidores face à incerteza ou à baixa rentabilidade de outros ativos financeiros. São os estrangeiros e os mais ricos que fazem com que os preços subam diariamente. Com um retorno do investimento em habitação de 9,7%, não é de estranhar que Portugal se tenha tornado um dos países que mais investidores atraem. Mas não é só um problema do nosso país. Em toda a OCDE, a compra de habitação como investimento cresce mais do que a aquisição de uma habitação primária. No fundo, a habitação é cada vez mais um bem financeiro, o que colide frontalmente com o seu estatuto de necessidade básica. E é isso que é preciso mudar, muito antes de qualquer política de habitação de qualquer Governo. Por muito que se construam casas de renda acessível. Fosse o mercado financeiro mais apetecível e logo deixariam de existir investidores que compram em planta para terem os apartamentos vazios.
António José Gouveia – Jornal de Notícias - 15 outubro, 2024