A Carta do Presidente da Câmara
Exmo Senhor Primeiro-Ministro, Professor Cavaco e Silva
Excelência
Dirijo-me a V: Exª por na altura
em que tive o prazer de o receber nos Paços do Concelho de Nisa ter afirmado
estar permanentemente disponível (e até interessado) para lhe apresentarmos as
reclamações do concelho, em particular as que assumissem mais gravidade em áreas
de responsabilidade de sectores da Administração Central.
Efectivamente, este Verão tivemos
no concelho de Nisa em termos de assistência médica às populações uma situação
deveras gravosa, com largas semanas sem quaisquer tipo de cuidados em muitas
das nossas vilas e aldeias, abrangendo esta lacuna, num processo que já não
ocorria há dezenas de anos, localidades com mais de 2000 utentes.
A par do sofrimento humano e do
reforço da dependência social das populações, assistiu-se a um fenómeno de
auto-consumo de medicamentos sem controlo médico algum, mesmo esse só possível
pela colaboração permanente de utentes, funcionários e farmácias locais.
Parece-me uma situação injusta
para as populações do concelho sujeitas a tão desumana privação, tanto mais
grave quando se acaba de publicar uma Lei de Bases de Saúde que privilegia os
cuidados primários de saúde e nos queremos integrar plenamente na Europa.
Em termos comparativos seria como
se o Município (por absurdo) nos meses de Verão, em que há mais resíduos sólidos
(e em que também há mais população) deixasse de recolher o lixo nas diferentes
localidades e obrigasse os munícipes a vir depositar os contentores à sede do
concelho, suportando os custos do transporte a partir da sua localidade.
Trata-se de uma situação que me
parece desumana e que é desejável não se repetir em próxima ocasião em que se
repitam as mesmas circunstância.
O (legitimíssimo) direito a férias
em qualquer estrutura da administração não pode acarretar automaticamente o
sacrifício da generalidade da população utente.
O caso é tanto ou mais caricato
quando no actual momento, em termos municipais, em processo realizado em
colaboração frutuosa com sectores dependentes do Governo a que V. Exª preside,
estamos a implementar um processo de descentralização, modernização e
desburocratização que aproxima serviços das populações, evitando-lhes deslocações,
sacrifícios, despesas desnecessárias.
Espero, por razoáveis serem as
questões colocadas, o empenho efectivo de V. Exª.
Acredite que ao intervir na
denúncia do que nos parece francamente mal, o faço com o mesmo sentido positivo
dos vários apoios que concedemos no Município a organismos (mesmo estatais) que
intervêm na Acção Social em benefício das populações.
Aproveito a ocasião para convidar
V. Exª a regressar ao concelho de Nisa, em caso de nova deslocação à nossa região
na qualidade de Primeiro-Ministro.
Com os melhores cumprimentos,
O Presidente da Câmara
José Manuel Semedo Basso
A deficiente prestação de cuidados
de saúde no concelho de Nisa no Verão de 1990 levou o Presidente da Câmara
Municipal de Nisa a escrever ao Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Silva, em
Setembro de 1990.
O documento foi tornado público na
altura, desconhecendo-se qual a resposta e o impacto que o mesmo teve na
resolução dos problemas apresentados e na consequente melhoria dos serviços de
saúde.
Há 25 anos, o alerta foi lançado. A
saúde no concelho de Nisa estava doente. E doente continuou por muitos e bons
anos, até aos dias de hoje, com as histórias, algumas tristes que se conhecem,
entre estas a perda de camas e dos serviços de internamento, a redução de horários no Centro de Saúde, a ida ao Hospital de Portalegre por um qualquer "arranhãozinho".
Hoje, a “menina dos olhos” dos políticos
locais é a construção de um novo Centro de Saúde. Mais uns largos milhares de
euros na criação de uma infra-estrutura, sem a correspondente dotação de meios
técnicos e humanos, em número e qualidade suficientes para acudir, com eficiência e em tempo
útil, à população do concelho, cada vez mais envelhecido e desertificado.
Mudam-se os tempos; (não se) mudam as vontades...
Mário Mendes