30.11.15

NISA: Presidente da Câmara escreve ao Primeiro-Ministro (Setembro de 1990)

A Carta do Presidente da Câmara
Exmo Senhor Primeiro-Ministro, Professor Cavaco e Silva
Excelência
Dirijo-me a V: Exª por na altura em que tive o prazer de o receber nos Paços do Concelho de Nisa ter afirmado estar permanentemente disponível (e até interessado) para lhe apresentarmos as reclamações do concelho, em particular as que assumissem mais gravidade em áreas de responsabilidade de sectores da Administração Central.
Efectivamente, este Verão tivemos no concelho de Nisa em termos de assistência médica às populações uma situação deveras gravosa, com largas semanas sem quaisquer tipo de cuidados em muitas das nossas vilas e aldeias, abrangendo esta lacuna, num processo que já não ocorria há dezenas de anos, localidades com mais de 2000 utentes.
A par do sofrimento humano e do reforço da dependência social das populações, assistiu-se a um fenómeno de auto-consumo de medicamentos sem controlo médico algum, mesmo esse só possível pela colaboração permanente de utentes, funcionários e farmácias locais.
Parece-me uma situação injusta para as populações do concelho sujeitas a tão desumana privação, tanto mais grave quando se acaba de publicar uma Lei de Bases de Saúde que privilegia os cuidados primários de saúde e nos queremos integrar plenamente na Europa.
Em termos comparativos seria como se o Município (por absurdo) nos meses de Verão, em que há mais resíduos sólidos (e em que também há mais população) deixasse de recolher o lixo nas diferentes localidades e obrigasse os munícipes a vir depositar os contentores à sede do concelho, suportando os custos do transporte a partir da sua localidade.
Trata-se de uma situação que me parece desumana e que é desejável não se repetir em próxima ocasião em que se repitam as mesmas circunstância.
O (legitimíssimo) direito a férias em qualquer estrutura da administração não pode acarretar automaticamente o sacrifício da generalidade da população utente.
O caso é tanto ou mais caricato quando no actual momento, em termos municipais, em processo realizado em colaboração frutuosa com sectores dependentes do Governo a que V. Exª preside, estamos a implementar um processo de descentralização, modernização e desburocratização que aproxima serviços das populações, evitando-lhes deslocações, sacrifícios, despesas desnecessárias.
Espero, por razoáveis serem as questões colocadas, o empenho efectivo de V. Exª.
Acredite que ao intervir na denúncia do que nos parece francamente mal, o faço com o mesmo sentido positivo dos vários apoios que concedemos no Município a organismos (mesmo estatais) que intervêm na Acção Social em benefício das populações.
Aproveito a ocasião para convidar V. Exª a regressar ao concelho de Nisa, em caso de nova deslocação à nossa região na qualidade de Primeiro-Ministro.
Com os melhores cumprimentos,
O Presidente da Câmara
 José Manuel Semedo Basso
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A deficiente prestação de cuidados de saúde no concelho de Nisa no Verão de 1990 levou o Presidente da Câmara Municipal de Nisa a escrever ao Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Silva, em Setembro de 1990.
O documento foi tornado público na altura, desconhecendo-se qual a resposta e o impacto que o mesmo teve na resolução dos problemas apresentados e na consequente melhoria dos serviços de saúde.
Há 25 anos, o alerta foi lançado. A saúde no concelho de Nisa estava doente. E doente continuou por muitos e bons anos, até aos dias de hoje, com as histórias, algumas tristes que se conhecem, entre estas a perda de camas e dos serviços de internamento, a redução de horários no Centro de Saúde, a ida ao Hospital de Portalegre por um qualquer "arranhãozinho".
Hoje, a “menina dos olhos” dos políticos locais é a construção de um novo Centro de Saúde. Mais uns largos milhares de euros na criação de uma infra-estrutura, sem a correspondente dotação de meios técnicos e humanos, em número e qualidade suficientes para acudir, com eficiência e em tempo útil, à população do concelho, cada vez mais envelhecido e desertificado.
Mudam-se os tempos; (não se) mudam as vontades...
Mário Mendes