12.1.25
Marcha antirracista enche centro de Lisboa: “Portugal é de todos! Não nos encostem à parede”
Milhares de pessoas marcham este sábado pela Avenida Almirante Reis, em Lisboa, contra o racismo e a xenofobia em Portugal e para exigir direitos iguais para os imigrantes. A extrema-direita respondeu ao marcar presença no local de partida no desfile e o Chega com uma vigília a poucos metros do Martim Moniz
“Portugal é de todos! Não nos encostem à parede”. Foi assim que milhares de pessoas se fazem ouvir, este sábado, pelo centro de Lisboa, onde protestam contra a forma de atuação da polícia durante a operação na rua do Benformoso, no mês passado, em que dezenas de imigrantes foram encostados contra as paredes dos prédios serem revistados.
A residir em Portugal há mais de uma década, Om Gharti vê com preocupação um aumento de comportamentos discriminatórios e racistas contra imigrantes nos últimos tempos. “Nós só queremos trabalhar, pagar a segurança social e direitos iguais para termos uma vida digna em Portugal, sejamos asiáticos, cabo-verdianos ou guineenses”, afirmou o nepalês, de 34 anos, que fez de Lisboa casa, onde já nasceram as suas duas filhas.
Om era um entre centenas de imigrantes que seguiam à frente na marcha com destino ao Martim Moniz, em defesa da integração de todos os que procuram uma vida melhor em Portugal. No atendimento da Solidariedade Imigrante - uma das associações organizadoras do protesto -, onde trabalha, Om contou deparar-se diariamente com relatos de imigrantes que veem ser negada ajuda pelo simples facto de não falarem português. O imigrante contestou ainda dificuldades nos processos de regularização.
Foram principalmente essas barreiras que levaram Umesh Kumar khadka às ruas. “Há quem submeta os documentos para a autorização de residência e espere mais de oito, nove meses. Nós queremos ter os nossos documentos legais o mais rápido possível”, explicou o presidente da Associação de Nepaleses Residentes em Portugal.
O seu caso não é exceção: Umesh vive em Portugal desde 2015, pediu a nacionalidade portuguesa há dois, e desde então que aguarda. O nepalês confessou ter ficado chocado com a atuação policial na Benformoso, que considerou ser um ato racista. “Hoje em dia sentimos discriminação, e está a ficar pior, mas queremos que tudo melhore”, lamentou.
"A violência tem cor e etnia"
Heloísa Fuzari não conseguiu ficar indiferente às imagens na Benformoso. Com um cartaz onde se podia ler “Parem de nos encostar à parede”, a jovem brasileira de 20 anos protestou contra a violência a que as comunidades imigrantes são alvo.
“A gente sabe que a violência tem cor, etnia e nacionalidade. E a tendência é o ódio crescer, mas a gente não pode deixar que passe”, defendeu a estudante universitária.
Entre o mar de gente, uma mensagem saltou à vista. "Encostem o Chega à parede", encontrava-se escrito no cartaz que Isabel Santos segurava. A manifestante quis condenar a retórica discriminatória usada por forças políticas como o partido de André Ventura.
"A criminalidade existe, como em qualquer lugar, mas não pode ser atribuída aos imigrantes. Isso não faz sentido, nem é suportado pelos estudos", argumentou Isabel.
Para a lisboeta, ações como a que aconteceu no Benformoso, "fomentam o ódio e a animosidade" em comunidades vulneráveis. "Portugal ainda tem uma população muito permeável ao populismo, e isso está a dificultar a integração de comunidades imigrantes", lamentou.
O Chega respondeu à manifestação com uma vigília de apoio às forças de segurança, denominada "Pela autoridade e contra a impunidade". A ação, que decorreu à mesma hora da marcha, juntou cerca de duas centenas de apoiantes e militantes, vestidos de preto, na Praça da Figueira, a poucos metros do Martim Moniz.
Já um grupo de apoiantes e milirantes do partido extrema-direita Ergue-te e do movimento Habeas Corpus contestaram o protesto ao marcar presença num dos lados da Alameda, ainda antes do início do desfile.
Durante breves minutos, de um lado da Alameda cantou-se o hino nacional. Do outro, militantes de esquerda, nomeadamente do Bloco de Esquerda, ripostavam com “25 de abril sempre, fascismo nunca mais”, de punhos no ar. “Fascistas, fascistas chegou a vossa hora, as imigrantes ficam e vocês vão embora”, gritavam, sob o olhar atento da polícia. A PSP criou um perímetro de segurança entre as ações.
Na manifestação antirrascista foi visível a participação de militantes e dirigentes da esquerda, que pediram uma sociedade “sem divisões”.
• Inês Malhado – Jornal de Notícias - 11 janeiro, 2025