Mostrando postagens com marcador combatente da liberdade. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador combatente da liberdade. Mostrar todas as postagens

23.2.20

ZECA AFONSO: Fechou os olhos há 33 anos

Janita Salomé: "Quando a Luz Fechou os Olhos"
Da floresta de criadores poético-musicais alguns logram elevar-se acima do manto copal e atingem uma tal dimensão que se afirmam como referências de admiração e de respeito, tanto da sua geração como das posteriores. José Afonso pertence a essa categoria de colossos que, pelo exemplo de vida e pela mensagem que a sua arte tão eloquentemente transmite, se tornaram faróis indicadores e iluminadores do caminho a seguir por todos quantos demandam a «cidade do homem / não do lobo, mas irmão». A Luz fechou os olhos perfaz hoje 33 anos mas a sua cintilação não se apagou e continua a iluminar quer aqueles que a presenciaram quando foi tocha acesa na noite escura quer – e mais importante – os que tendo nascido depois já só puderam contar com o legado musical/fonográfico. Provam-no as muitas revisitações que se vêm fazendo ao repertório do autor de "Cantares do Andarilho", seja em actuações ao vivo seja em gravações de estúdio. Como diz Janita Salomé, na canção que hoje aqui destacamos em tributo à memória do trovador maior da música popular portuguesa, «basta um sopro mágico, liberto, / para que a luz acorde a cantar».
Uma pergunta, a talhe de foice: como se explica que José Afonso, Janita Salomé e tantos outros nomes grados da nossa música estejam hoje excluídos da 'playlist' da Antena 1 e só, de tempos a tempos, surja uma ou outra das suas canções em programas de autor geralmente transmitidos a horas de sono? Fica à reflexão de quem tem por competência escrutinar e avaliar o serviço prestado pela rádio pública no domínio (importantíssimo) da música.


Letra: Hélia Correia
Música: Janita Salomé
Intérprete: Filipa Pais* (in CD "L'Amar", Strauss, 1994)
Quero falar-te e o coração, de comovido,
Perde as palavras que juntara para ti.
Cantar-te sei e apenas isso faz sentido.
Menino de oiro,
Vem sentar-te aqui.
Menino de oiro,
Vem sentar-te aqui.

Por todo o ano é tempo de cantar janeiras.
Mulher da erva, ainda agora a vi passar.
Por mar profundo, terra e todas as fronteiras
Venham mais cinco
Mil p'ra te saudar.
Venham mais cinco
Mil p'ra te saudar.

Pode o sol morrer de velho,
Pode o gelo arder também.
Mas a voz que de ti nasce
Já não morre com ninguém.

No céu cinzento, o astro mudo ainda revela
Um bater de asas, o disfarce do seu pé.
Bebem do sangue, comem tudo, olhai, cautela
O que faz falta
Já se sabe o que é.
O que faz falta
Já se sabe o que é.

Junta-te a nós, ó bairro negro, vem, falua,
P'la noite fora até que se erga o sol do Verão
Solta as amarras, sopra, ó vento, continua,
Que este homem não
Se foi embora, não.
Que este homem não
Se foi embora, não.

Pode o sol morrer de velho,
Pode o gelo arder também.
Mas a voz que de ti nasce
Já não morre com ninguém.

29.6.18

Morreu José Manuel Tengarrinha, fundador do MDP/CDE

José Manuel Tengarrinha, fundador do MDP/CDE, morreu hoje aos 86 anos, confirmou à agência Lusa o dirigente do Livre Rui Tavares.
José Manuel Tengarrinha, que foi deputado na Assembleia Constituinte, era atualmente militante do partido Livre.
Historiador e professor, o fundador do Movimento Democrático Português/Comissão Democrática Eleitoral (MDP/CDE) chegou a ser preso pela PIDE e esteve na Cadeia do Aljube.
Fonte próxima da família adiantou à agência Lusa que o corpo vai no domingo, às 18:00, para a Basílica da Estrela, em Lisboa, de onde saíra na segunda-feira para cremação, numa cerimónia reservada à família.

2.8.16

IN MEMORIAN. José Afonso - 87 anos

José Afonso faria hoje 87 anos.
 José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos (Aveiro, 2 de Agosto de 1929 — Setúbal, 23 de Fevereiro de 1987), foi um cantor e compositor português. É também conhecido pelo diminutivo familiar de Zeca Afonso, apesar de nunca ter utilizado este nome artístico.
José Afonso (canto inferior esquerdo) na época em que foi professor provisório na Escola Industrial e Comercial de Faro (de 7 de Outubro de 1958 a 18 de Julho de 1959).

5.10.15

Morreu José Vilhena, o sátiro cartoonista da Gaiola Aberta

Escritor, cartoonista e pintor, José Vilhena foi o grande sátiro da condição portuguesa, em ditadura e em liberdade, sem poupar nos alvos e com gosto declarado pelo erotismo. Morreu este sábado, aos 88 anos.
Cartoonista, humorista, escritor e pintor. Quatro condições interligadas na vida e obra de um homem que, desde a década de 1950, se dedicou a satirizar, sem poupar ninguém, dos poderosos ao povo oprimido, a realidade política e social do país em que nasceu. Antes da Revolução de Abril viveu com a censura à perna de forma quase ininterrupta, ou não tivesse assinado quase seis dezenas de livros, todos censurados, todos vendidos ao seu público fiel por baixo da mesa nas tabacarias.
Onze dias depois do 25 de Abril de 1974, começou a fazer a sua cronologia da revolução em Gaiola Aberta, o seu título mais célebre. “One man show”, trabalhador verdadeiramente independente que se responsabilizava sozinho por todo o processo de elaboração e produção dos seus livros e revistas, José Vilhena, nome incontornável do humor português, na linha de um Bordalo Pinheiro, mas contemporâneo da libertação sexual das décadas de 1960-70 (e notava-se muito, ou não fosse o corpo feminino presença constante na sua obra), morreu este sábado, aos 88 anos, vítima de “doença
prolongada”, como se lê no site O incorrigível e manhoso Vilhena (www.vilhena.me), gerido pelo seu sobrinho Luís Vilhena. Encontrava-se internado no Hospital São Francisco Xavier.
O título do site supracitado é uma referência directa a um dos muitos relatórios da comissão de censura do Estado Novo dedicados às suas publicações. Nele, emitido em 1965, lia-se: “O incorrigível e manhoso ‘Vilhena’ não quis deixar acabar este ano de 1965 sem lançar a público mais uma das suas produções deletérias que por artes ocultas circulam sempre a despeito das proibições que sobre elas incidem. Posto hoje à venda, segundo creio” – escreve o autor do relatório –, “não encontro neste livro uma única página que possa ser autorizável. Portanto, proponho a sua rigorosa proibição”.
De si próprio, Vilhena dizia ser “uma espécie de trapezista”: “A malta comprava os meus livros porque achava que no dia seguinte eu ia preso”. E foi, por três vezes, em 1962, 1964 e 1966. Muito a propósito, Rui Zink recorda ao PÚBLICO a definição de censura que ouviu a José Vilhena: “Censura é a técnica de separar o trigo do joio, a fim de publicar o joio” – “também se aplica aos jornais de hoje”, acrescenta.
Zink, que privou de perto com José Vilhena, descreve-o como “um diamante no meio de ovelhas murchas”, alguém que, seguindo a máxima de Groucho Marx, se recusava a pertencer a qualquer clube. “O Aquilino Ribeiro chegou a tentar levá-lo para um clube, para a Associação Portuguesa de Escritores, mas ele declinou timidamente dizendo que não era escritor”. A actividade diversificada de Vilhena, aponta Rui Zink, nasce, de resto, da inexistência de escritores populares de humor em Portugal. “Do que ele gostava era de desenhar, mas, dada essa circunstância, acabou por se tornar cartoonista, escritor, editor, distribuidor.”
Nascido a 7 de Julho de 1927 em Figueira de Castelo Rodrigo, José Vilhena frequentou a Escola de Belas-Artes do Porto, inserido no curso de arquitectura que não chegaria a concluir, culpa do trabalho que começara a fazer para o Diário de Lisboa, Cara Alegre e O Mundo Ri, que co-fundou na década de 1950.
Trabalhou o humor de diversas formas, recorrendo a escrita literária, à ilustração, ao cartoon ou à fotomontagem. Esta última expressão criativa valeu mesmo a um inusitado protagonismo internacional, quando no início dos anos 1980 José Vilhena é alvo de um processo interposto por Carolina do Mónaco, na sequência de uma fotomontagem em que, parodiando o anúncio de uma marca de brandy, colocou a princesa “a aquecer o seu copo de uma maneira original”, recordava em 2003 ao Correio da Manhã.
Entre a sua bora, destacam-se, antes do 25 de Abril, obras como História da Pulhice Humana (1961), O Filho da Mãe (1970) ou Branca de Neve e os 700 Anões (1962), esta incluída na série Livros Proibidos editada com o PÚBLICO. É nesse período que José Vilhena mais brilha, considera Rui Zink. “Os retratos que fez daquele morno Portugal de Salazar são maravilhosos. Depois do 25 de Abril, as pessoas ganharam coragem e surgiram concorrentes mais jovens, mais adequados ao tempo, mais ágeis, mais à esquerda. Há sempre um sacana que gosta mais de liberdade do que nós quando já não há riscos a correr”, ironiza. Durante a ditadura, José Vilhena era “uma estrela solitária a fazer aquele tipo de humor e, mesmo as pessoas que não liam os livros dele conheciam as histórias dos seus livros”, recorda Zink. Segundo o escritor, “foi o grande humorista transversal de antes do 25 de Abril e teve a importância do Herman [José] e dos Gatos Fedorento juntos”.
Mário Lopes in "Público" 03/10/2015 



4.7.12

Morreu o Manuel Diogo: Arquitecto de sonhos, construtor de esperanças

"Eles não sabem que o sonho, é uma constante da vida…"
Manuel da Conceição Tavares Diogo, 61 anos, natural de Arneiro, reformado da Celulose do Tejo, faleceu no passado fim- de- semana em Coimbra, vítima de doença que se lhe revelou de forma vertiginosa e imparável.
Morreu um homem bom do Arneiro, um arquitecto de sonhos e de causas, um militante da esperança e da vida, uma vida de que se despediu, cedo de mais, para quem como ele, acreditou sempre que era possível um mundo melhor, mesmo depois de perceber que não conseguia "mudar o mundo", essa utopia que galvanizou milhares de jovens, dinâmicos, voluntariosos e solidários, nas décadas de 70 e 80 do século passado.
Manuel Diogo, viveu, como poucos, de forma activa e empenhada, quer como militante político de esquerda, como delegado e dirigente sindical dos metalúrgicos ou como eleito local na sua freguesia.
Pertenceu a comissões de festas, do lagar, do clube desportivo, que ajudou a criar e sempre que algo de novo em favor da sua terra e freguesia se perspectivasse, lá estava o Manel, na primeira linha, disponível, com aquela disponibilidade de quem não quer nada em troca, nem media a participação cívica pelo deve e haver com que muitos, hoje, se perfilam para listas e lugares.
O Manuel Diogo partiu do nosso convívio. Foi a sepultar nesta segunda-feira na sua terra natal, o seu Arneiro que o viu nascer no primeiro ano da década de 50, uma terra onde faltava tudo, mas sobravam as crianças que descalças jogavam à bola e ao pião.
Não estranhei a multidão que o acompanhou à sua derradeira morada, numa hora de calor sufocante. O povo da sua freguesia, os companheiros da Celulose onde travou e liderou com a sua determinação e exemplo, muitas e muitas lutas, em defesa de interesses sociais e colectivos.
O Manuel Diogo morreu. O seu exemplo fica. Deixo à família e amigos, votos de sentidas condolências.
Mário Mendes in "Alto Alentejo" - 4/7/2012