29.5.10

IN MEMORIAN: Luz e trevas em Heysel Park



Passam hoje, 29 de Maio, 25 anos sobre a tragédia no Heysel Park. Disputava-se o jogo da final da Taça dos Campeões Europeus, entre o Liverpool e a Juventus, quando um grupo de “hooligans” ingleses desencadearam um espiral de violência que culminou na morte de 39 espectadores, entre os quais 32 adeptos italianos.
Em 1988, três anos após a tragédia do Heysel Park, escrevi e publiquei em diversos jornais, este texto evocativo e de homenagem às vítimas da violência no desporto.
Eram não sei quantos mil, naquele fim de tarde luminoso, no estádio de Heysel, em Bruxelas.
Estou a vê-los, como se fosse ontem: bandeiras multicolores, rubras na sua maioria, empunhadas por jovens de corpos agitados, delirantes, olhos esbugalhados e vozes roucas.
Entoavam cânticos, como os guerreiros antes da batalha, num ritual próprio das grandes finais.
Eram não sei quantos mil em Heysel Park.
Estavam ali, vindos da Grã-Bretanha e da Itália, gritando pelos “reds” e pela “juve” num jogo de futebol que, como tantos outros, deveria ser sinónimo de festa, alegria, participação...
Eram não sei quantos mil em Heysel Park, esperando o apito do árbitro, o início do “match” ou, simplesmente, o fim de todas as angústias.
Pressente-se no ar um bafo de terror. Mas, não. É apenas um jogo de futebol, entre campeões, num fim de tarde de Primavera.
A relva verde e viva da terra de Balduíno, flamengos e valões é um enorme tapete de esperança, que não deixa adivinhar a tragédia iminente.
De repente, como um vulcão irrompendo, a violência explode. São cenas de terror, de barbárie, animalescas, projectadas para todo o mundo através da televisão.
O sangue, a morte, a irracionalidade à solta, a tingirem de surpresa e vergonha, como punhais cravados, os écrans da nossa impotência...
O jogo pára e recomeça, indiferente às vítimas que tombam. O espectáculo televisivo também. Há outros jogos, de milhões, em disputa.
O que era suposto ser festa, convívio, vibração, transformara-se, num ápice no “circo romano”.
A violência, a dor e a morte, a brutalidade dos novos bárbaros modernos é ali exaltada, “ao vivo”, como se fora um concerto de “heavy metal” com milhões de (tele) espectadores.
Eram não sei quantos mil no estádio do Heysel, em Maio de 1985.
A relva verde esperança do chão belga que se oferecia como palco do encontro entre campeões, foi subitamente manchada, agredida, violada e pela Primavera, ao anoitecer, ainda se ouvem os gritos dos infelizes perseguidos pela “horda dos monstros”, ecoando como súplicas lancinantes, desesperadas...
Eram não sei quantos mil em Heysel Park. Faz hoje 25 anos. Para que a memória não esqueça e a tragédia não se repita!
Nunca mais!
Mário Mendes