8.1.25

OPINIÃO: Musk, muito mais do que um troll

O ritmo e brutalidade dos golpes de Elon Musk sobre países europeus contrastam com o evidente desnorte, desconforto e reticências dos líderes visados. Ao longo de centenas de publicações atacando o Reino Unido, o multimilionário trucidou o primeiro-ministro Keir Starmer com uma onda de desinformação, exigiu a libertação do “hooligan” de extrema-direita Tommy Robinson e numa fração de segundo transferiu Nigel Farage da posição de aliado para a de inimigo. Em Itália noticia-se um contrato de cibersegurança entre o Governo e a empresa SpaceX, ao mesmo tempo que Meloni vai fazendo o seu caminho como interlocutora preferencial de Donald Trump para a Europa. Quanto às eleições na Alemanha, o apoio expresso de Musk à AfD passa pela promessa de promover um debate ao vivo com a candidata, Alice Weisel, na rede social X. Questionado sobre a torrente de insultos que lhe têm sido (e a outros líderes) direcionados, o chanceler Olaf Scholz fez um pedido: “Não alimentem o troll”. Ainda que a Europa não saiba, por agora, como falar com alguém como Musk, fingir que nada se passa não pode ser opção. O futuro membro da Administração dos EUA não é um troll como outros, mas alguém que combina de forma inédita ação política, poder económico e tecnológico e capacidade desmedida de interferência e persuasão. O X não é escrutinável e funciona como um braço armado do seu pensamento ditatorial sobre o mundo. O silêncio diplomático é inútil para travar o caos que Musk consegue causar. Não há nada de subtil na estratégia a que assistimos, bem pelo contrário: todo o espetáculo de desordem e mentira se passa em público, com Musk a desafiar os adversários e a humilhar os próprios parceiros quando se distanciam das suas atoardas. Conseguirá abrir caminho para a ascensão da direita mais extrema ao poder? O risco de isso acontecer é evidente e não há como ignorá-lo. • Inês Cardoso – Jornal de Notícias - 08 janeiro, 2025