9.1.25
OPINIÃO: A sofreguidão de Ventura
André Ventura assustou-se com a OPA de Luís Montenegro ao tema da segurança. Nos últimos anos esteve sozinho no mercado e foi recolhendo os respetivos dividendos eleitorais. É um investimento especulativo e, frequentemente, sem adesão à vida real, um pouco como o negócio das bolsas. Mas tem compensado. Daí a aflição do líder do Chega.
No espaço de poucos dias, foi o pedido a Marcelo Rebelo de Sousa para que promovesse uma reunião do Conselho de Estado sobre o tema, que o presidente surpreendentemente amplificou. Foi o anúncio da candidatura à Presidência, que diz ser motivado “pelo contexto de insegurança do país”. Foi o debate de urgência sobre o estado da segurança em Portugal na Assembleia da República.
Sempre com o mesmo tipo de retórica populista, que opõe “os portugueses de bem contra os bandidos”. E os bandidos, já se sabe, são os imigrantes, em particular os indianos, paquistaneses e nepaleses, e os que professam a fé islâmica, que, segundo Ventura, transformarão as ruas do nosso país num cenário semelhante ao que vemos “na Síria e no Afeganistão”. Sem esquecer os cidadãos de etnia cigana, que cometem todo o tipo de crimes com “impunidade”. Nada disto é verdadeiro, mas isso não interessa para nada. O mercado do Chega não é o da verdade.
É evidente que há problemas de segurança em Portugal. Por exemplo, as dezenas de mulheres assassinadas todos os anos por maridos, namorados, companheiros, quase todos portuguesinhos de gema e caucasianos. E que os problemas de segurança, mesmo quando os números não dão conta de agravamento, precisam de atenção e de medidas permanentes. Como é factual que há problemas de integração de imigrantes e algumas situações de descontrolo da imigração que também precisam de reflexão e de medidas políticas.
Do que este tema não precisa é que a demagogia de André Ventura e do Chega, que se baseia em impressões, preconceitos e, muitas vezes, em xenofobia e racismo puro e simples, se imponha sem contraditório. A sofreguidão nesta matéria é perigosa.
• Rafael Barbosa – Jornal de Notícias - 09 janeiro, 2025