3.12.24
ESTREMOZ: “Saber Fazer Abril Sempre”. A Revolução vista por artesãos de todo o país
Chama-se “Saber Fazer Abril Sempre” e reúne obras de alguns dos melhores artistas e artesãos do país. A exposição pode ser vista até ao próximo dia 18 de janeiro no Museu Berardo de EstremozAna Luísa Delgado (texto)
O curador da exposição, Alexandre Correia, revela que o objetivo foi “recuperar” alguns dos melhores trabalhos produzidos ao longo do ano sobre as comemorações dos 50 anos da Revolução dos Cravos. Na mostra surgem trabalhos feitos nos mais diferentes materiais, do barro à pasta de papel, do bordado à tapeçaria, filigrana ou escultura em pedra, linguagens tradicionais e contemporâneas e velhos mestres lado a lado com jovens artesãos. “Houve também um cuidado especial em selecionar obras cujo saber fazer seja identitário das várias regiões do nosso país”, sublinha Alexandre Correia.
Peço-lhe que nos apresente esta exposição.
Bom, “Saber Fazer Abril Sempre” é uma exposição coletiva, onde convivem 65 artesãos do nosso país, incluindo Açores e Madeira. É o ano em que se comemoram os 50 anos de 25 de Abril, estamos a terminar esse ano e, ao longo de 2024, muitos foram os artesãos nacionais a desenvolver peças sobre esta temática. Alguns foram desafiados pelos seus próprios municípios, outros por iniciativa própria, com exposições em diversos locais, como Barcelos, Caldas da Rainha, Mafra, Aveiro, Porto ou Silves. Ora, eu visitei grande parte dessas exposições e vi peças fantásticas, muitas delas premiadas, e lembrei-me de fazermos em Estremoz uma compilação dessas obras comemorativas dos 50 anos de Abril.
Temos então várias expressões de artesanato…
Vários artesãos, vários materiais que são identitários da nossa cultura e das várias regiões do nosso país e também peças mais contemporâneas, sem esquecer o tradicional, como a arte pastoril, os Bonecos de Estremoz, o figurado em barro de Barcelos, o bordado de crivo, o bordado de Castelo Branco, a olaria de Viana do Alentejo… todos estes saber fazer que são identitários do nosso país estão, de alguma forma geral, expostos nesta exposição.
Com um traço comum a todos eles?
Sim, há um traço comum a todos que é o saber fazer, no fundo, é aquilo que nos identifica. São grandes mestres do nosso artesanato que se juntaram, que se uniram em prol destas comemorações dos 50 anos do 25 de Abril e que o fizeram à sua maneira, dando-nos a sua visão, transmitindo-nos a forma como sentem os valores de Abril. E por isso é que a exposição se chama “Saber Fazer Abril Sempre”. É a nossa identidade, enquanto povo, enquanto nação, que nos identifica e nos distingue dos restantes países.
Há, portanto, a presença de artesãos e artistas alentejanos. Posso pedir-lhe para nos referir alguns?
Temos vários, olhe de Estremoz temos vários, como as irmãs Flores, o Ricardo Fonseca, o José Carlos Rodrigues, depois temos o Moreira, também de Estremoz, o senhor Pereira, com os mármores, temos também o mestre Vinagre, com a sua arte pastoril, ele que é de Veiros… também o Henrique Paim, um jovem que agora está a dar os primeiros passos também no artesanato, ou a pintora Teresa Pizarro. De Évora temos representado o Mal Barbado [utensílios de madeira] … tentei também que esta exposição fosse transversal às várias faixas etárias, com um artesão de 94 anos, como o mestre Vinagre, ao lado de outros mais novos, como uma jovem oleira de Lisboa com 19 anos. Temos também representado o mestre Feliciano, de Viana do Alentejo, o Chico Tarefa, de Redondo, a Fátima Lopes, de Estremoz…penso que não me estou a esquecer de nenhum.
Trazer Abril para o artesanato, ou se quiser o artesanato para as comemorações de Abril, tem também algum significado político?
Cada um terá as suas formas e visões de ver Abril, não foi a minha intenção ter qualquer referência política, o artesanato é o artesanato, as artes são as artes, mas cada um fará a sua interpretação consoante as suas convicções políticas. Pretendi sim realçar os valores de Abril, que devemos ter presentes, valores como a liberdade de expressão, na cultura, nas artes ou no artesanato, como é este caso particular.
Visitou as exposições, mas como é que chegou a alguns desses artistas, sobretudo os mais novos?
Sou colecionador e investigador de artesanato. Tenho a minha profissão, mas ocupo grande parte das minhas horas vagas, e das minhas finanças, no artesanato. Percorro muito o país, muitas feiras de artesanato, leio, vejo, estou sempre muito atento a novas cartas de artesão que vão saindo e depois, na sequência deste trabalho de pesquisa vou ao encontro das pessoas. Conheço os grandes mestres, que me falam dos jovens aprendizes que estão a formar, tento acompanhar esse trabalho e esse seu percurso, valorizar o trabalho deles, e é assim que estes jovens talentos que estão a emergir no nosso país.
A par dos velhos mestres.
Pois, é um prazer poder acompanhar de perto o trabalho que os grandes mestres desenvolvem, poder privar com eles, e conhecer as suas longas histórias, eles que são os detentores deste grande património que é o nosso artesanato.
MOSTRA VAI PERCORRER O PAÍS
A adesão do público está a corresponder às expectativas?
Deixe-me mencionar que o êxito desta exposição está a ser tal que vai passar a ser itinerante. Não nasceu com esse objetivo, a ideia foi fazer uma grande exposição em Estremoz, mas a quantidade de pessoas que esteve na inauguração, mais de uma centena, encheu as salas, houve gente de todo o país. Já tive o convite do presidente da Câmara das Caldas da Rainha para, após terminar esta exposição em Estremoz, seguirmos para lá e também já fomos abordados por um concelho mais a norte para avaliar a possibilidade de levar a exposição até lá.
• Alentejo Ilustrado - 27 de Novembro de 2024