12.6.25

OPINIÃO: As tropas de assalto


“Portugal aos portugueses”, dizem os panfletos deixados depois do ataque de um grupo de neonazis em Lisboa, em que um ator do grupo de teatro “A Barraca” foi violentamente agredido. Note-se que este é um manifesto político completamente normalizado na política portuguesa. Mesmo que não partilhe a metodologia dos grupúsculos neonazis, ou seja, mesmo que não defenda a difusão da mensagem à pancada, o Chega e o seu líder, André Ventura, não têm feito outra coisa senão repetir essa mensagem, “Portugal aos portugueses”. Vão até mais longe, porque é só para os “portugueses de bem”. Que os ciganos não são, na retórica radical do Chega. São, aliás, portugueses que querem assassinar Ventura, segundo declarações do próprio, no rescaldo do refluxo esofágico em que julgou estar a ser envenenado.

Na sequência da agressão em Lisboa, que foi só a mais recente demonstração da impunidade com que a extrema-direita atua no espaço público (uma vezes assumidamente neonazi, com cabeças rapadas e tatuadas; outras “apenas” xenófoba e racista, com penteados normais), levantou-se um coro de críticas, à Esquerda e à Direita. Incluindo o presidente da República, que fez questão de lembrar que “em democracia há e tem de haver liberdade de pensar e exprimir o pensamento, de forma plural e sem censuras", mas que “essa liberdade e esse pluralismo não podem ser calados, nem sovados, por quem discorda"

É fácil usar palavras duras contra esta gente. Para usar uma expressão que faz parte do livro "Falar à moda do Porto", são “calhaus com dois olhos”. Mais difícil e mais raro, é ouvir os políticos moderados, como Marcelo Rebelo de Sousa, apontarem diretamente ao elefante na sala. Como se o facto de um partido eleger 60 deputados lhe desse carta-branca para deitar borda fora 50 anos de democracia, direitos humanos, diversidade e inclusão. Não é uma acusação gratuita, é factual: o Chega partilha e promove uma parte do ideário destes grupúsculos neonazis. A grande diferença é que o partido de Ventura se fica pela violência verbal, enquanto os segundos assumem o papel que foi outrora das tropas de assalto.

 * Rafael Barbosa - Jornal de Notícias - 12.6.2025