15.6.25

NISA: Conheça os poetas do concelho (XXX) - João R.

 


AS SORTES

Síntese

Em 1971, chegou o meu dia de “sortes”: uma inspecção médica para decidir a incorporação nas forças armadas e, posterior, mobilização para a Guerra Colonial. Apesar de todos os receios, era um dia de festa. Todos os rapazes, que completavam 20 anos nesse ano, percorriam as ruas da aldeia, abraçados e a cantar ao som duma concertina. Para manter os ânimos íamos bebendo copinhos de vinho, em cada taberna: era uma tradição que se perdia nos confins do tempo. Inspirado por: TRIO MUSICAL VICTOR COSTA – Cantar na Adega.

CENAS DA ALDEIA – O DIA DAS SORTES

Música : Cantar na Adega – Trio Musical Vitor Costa

1

 Rua acima, rua abaixo,

Pega o copo e bota-abaixo,

Para molhar a garganta.

Rua abaixo, rua acima,

É o vinho que nos anima,

Que com água ninguém canta!

2

Aqui, ninguém desafina,

Ao toque da concertina,

Ao bater das castanholas.

E, quem não tem pandeireta,

Com os ferrinhos se ajeita

Ou na dança se consola.

3

Chegámos a cambalear,

Abraçados e a cantar,

À tasca da tchá Zabumba.

O “vento” estava forte;

Alguém que perdeu o norte

Caiu no chão, catrapumba!

4

 Manjericos na lapela

E as moças à janela,

Para nos verem passar.

Os olhares e sorrisos

Faziam sinais precisos

Pedindo pra namorar.

5

Vamos cantar e bailar,

Enquanto o dia durar,

Mesmo que a voz nos doa.

As pernas já nos fraquejam;

Nossos corações arquejam,

Mas a alegria ressoa.

6

Somos a malta das sortes

Esperando passaportes

Para a guerra fraticida.

Não era nossa vontade

Servir a tanta maldade,

Mas não nos resta saída.

7

Pra manter a tradição

E ganhar animação,

Vamos bebendo uns copinhos.

Celebramos a amizade:

Viva a nossa irmandade,

À espera doutros caminhos!

 

(João R. – Junho/2023)